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Criminalização exarcebada viola Direitos Humanos

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Home Artigos jurídicos Criminalização exarcebada viola Direitos Humanos Criminalização exarcebada viola Direitos Humanos Home Artigos jurídicos Criminalização exarcebada viola Direitos Humanos Criminalização exarcebada viola Direitos Humanos Submitted by eopen on ter, 17/07/2018 – 16:40 Um advogado e uma estudante de direito foram alvos de notícias estranhas. O primeiro, que já havia declarado ser um demônio, foi entrevistado pela TV confessando ser usuário de entorpecente, enquanto a moça declarou ódio a nordestinos que pretende ver mortos por afogamento.Ambos os casos obrigam-nos a uma reflexão sobre o que está acontecendo com os profissionais e os estudantes de direito, mas isso não implica em tentarmos julgar essas pessoas e nem mesmo – o que seria pior – criticar o destaque que a mídia deu a esses assuntos.Discordamos que se trata de notícia ruim, pois a única notícia ruim é a falsa. A imprensa não tem o direito, mas o dever de divulgar qualquer notícia que lhe pareça útil ou interessante. Uma sociedade só evolui quando pode dispor de qualquer informação, sem censura, sem qualquer conselho, autoridade ou mesmo juiz dizendo o que pode ou não ser divulgado.Aqueles fatos – um advogado ser toxicômano e uma estudante ser preconceituosa – não apresentam isoladamente nenhuma relevância.O uso regular de substâncias capazes de provocar dependência química é uma doença e deve ser tratada como tal através da medicina e da psicologia.A eliminação dos preconceitos talvez seja um processo mais demorado, vez que enraizado na alma da sociedade brasileira, que ainda se comete coisas ridículas e idiotas como falar em nobreza, chamar algumas pessoas de excelência e apelidar de doutor qualquer engravatado. Educação e cultura são coisas muito demoradas.As duas notícias repercutiram de forma que nos pareceu excessivamente burocrática e exageradamente formal. A Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais teria encaminhado o assunto ao Tribunal de Ética, enquanto uma seccional do nordeste pretende ver a estudante preconceituosa criminalmente apenada. O escritório onde ela fazia estágio resolveu dispensá-la. Se ela dependia do estágio para pagar a faculdade, passou a ter mais um problema além da ignorância.Parece-nos que tais questões mereçam ser tratadas com mais serenidade e até mesmo levando-se em conta a possibilidade de ocorrência daquilo que um ministro do STF chamou de “três minutos de insanidade”.Durante a XXVI Reunião de Presidentes de Subseções da OAB-SP, em 1999 em Águas de Lindóia, o então Ministro do STF, Carlos Mário da Silva Velloso, admitindo a hipótese de que votara certa matéria de forma equivocada, afirmou que “…certamente estava naqueles três minutos de insanidade que nós todos, que todo homem, todo dia passa…”.Ora, se um Ministro do Supremo admite que pode decidir questões de grande relevância para a Nação durante esses “três minutos de insanidade” , devemos admitir que advogados e estudantes acham-se sujeitos ao mesmo risco, que é o de passar por três minutos de insanidade todo dia.Dependência química é classificada como doença e nessas condições não pode ser classificada como infração ético-disciplinar. Parece-nos, pois, que um procedimento disciplinar no caso do advogado aqui citado dificilmente possa prosperar.Mas quando um advogado sofre de doença mental ele deve ser licenciado de oficio pela OAB, conforme o artigo 12, inciso III, da lei 8906. Ou seja: ele é afastado da profissão para que se recupere da doença. Cabe observar que a lei fala em doença mental curável, o que pode dar ensejo a discussões, uma vez que a lei tem mais de 16 anos e nesse espaço de tempo houve uma expressiva modificação nas ciências médicas, com o surgimento de medicamentos mais sofisticados e eficazes, o que nos obriga a reconhecer a necessidade de laudos psiquiátricos nesses casos. Doença que não era curável em 1994 talvez o seja hoje.Todavia, ainda que se trate de doença incurável, os direitos do doente devem ser respeitados e antes de mais nada verificado se a doença impede o trabalho, até porque o exercício da atividade quase sempre é ajuda importante no tratamento.De qualquer forma, não podemos nos esquecer que o advogado deve ser assistido e amparado pelos serviços assistenciais da OAB, conforme ordena o artigo 62 do nosso estatuto. Essa assistência deve ser a mais ampla possível, eis que a lei não lhe fixa limites, falando apenas em prestar assistência aos inscritos. Se o advogado tem doença deve ser assistido pela OAB, não disciplinarmente punido. Uma coisa exclui a outra.A história recente da advocacia registra vários casos de minutos de insanidade.Há cerca de dez anos um advogado sofreu vários processos disciplinares, quase sempre por ofensas a magistrados e colegas, quando usava linguagem totalmente incompatível com a profissão. Com algumas suspensões, já se podia antever que teria sua inscrição cancelada pela aplicação do artigo 38 da nossa lei.Mas advocacia e justiça não se limitam a aplicar a lei e esta é instrumento criado pelo homem para ser instrumento de sua felicidade. Não é a criatura humana que está a serviço da lei, mas o contrário.Por outro lado, estamos nos desviando dos princípios básicos da civilização e da declaração universal dos direitos humanos quando, a pretexto de controlar comportamentos, acabamos criminalizando qualquer coisa e transformando quase todas as nossas atitudes em coisas perigosas, que devem ser controladas pelo Grande Pai, o estado…Em face a tais princípios, a OAB-SP, por sugestão do relator do TED naquela ocasião, convidou o advogado para uma reunião, onde este confessou-se doente mental, declarando-se impossiblitado de arcar com as despesas do tratamento. Em face do laudo psiquiátrico reconhecendo a doença como curável, nosso colega foi temporariamente afastado da profissão, a ela retornando mais tarde quando recuperado e hoje trabalha sem problemas.Situação parecida também ocorreu em relação a advogado que voluntariamente se afastou da OAB por estar fazendo tratamento psiquiátrico e que recentemente pleiteou reinscrição eis que já está recuperado. Ou seja: quando acometido de doença mental – consta que dependência química assim se define – tem direito a afastar-se ou deve ser afastado de ofício o profissional que, recuperado, pode voltar ao exercício de seu trabalho. Note-se que não cabe à OAB pretender avaliar a recuperação, que só pode ser feita pelo médico psiquiatra.Outra situação ocorreu quando um jovem pretendia inscrever-se na OAB e teve seu pedido questionado, ao argumento de que fizera ameaças de morte a todos os ministros de STF, as quais teriam sido divulgadas pela internet. Uma situação um pouco parecida com a estudante de direito que não gosta de nordestinos.A inscrição foi concedida por unanimidade pelo Conselho da OAB-SP, que aceitou o parecer do relator, onde este demonstrou que as ameaças não eram sérias, que o pretendente à inscrição era um jovem de boa reputação e que tudo não passara de uma bobagem decorrente dos “… três minutos de insanidade que nós todos, que todo homem, todo dia passa…”.Ora, se todo homem passa, a mulher também passa. Assim, pretender crucificar uma jovem por uma besteira que ela falou ou escreveu, não engrandece ninguém. Não se trata de ignorar a ofensa, de concordar com o preconceito ou estimular tal comportamento. Trata-se de buscar uma solução harmônica, humana, que reconheça a nossa posição de animais racionais, sem que nos coloque na vala comum das bestas vingativas que encontram prazer no sofrimento de nossos semelhantes.No caso da estudante preconceituosa, muito provavelmente ela é duplamente vítima: a) da ignorância que ostenta, resultado do mau ensino que recebeu; e b) da falta de solidariedade e companheirismo de seus colegas de estudo e trabalho.Uma estudante que tivesse tido aulas pelo menos razoáveis teria a obrigação de saber que os maiores juristas, os mais relevantes autores da doutrina jurídica do Brasil, os mais consagrados mestres em todos os campos do direito foram nordestinos ou nortistas: Clovis Bevilacqua (cearense), Rui Barbosa (baiano), Djaci Falcão (paraibano), Pontes de Miranda (alagoano), Hugo de Brito Machado (piauiense) e tantos e tantos outros.A estudante que não sabe disso é culpada? Ora, deveria ser obrigatório o estudo das biografias dos grandes mestres do direito brasileiro. Mas, infelizmente, estuda-se apenas onde colocar o “x” na alternativa certa da prova do concurso. Se há alunos que fingem estudar, há professores que fingem ensinar.Fala-se em processar a estudante por racismo! Essa história de dizer que tudo é crime acaba por nos transformar todos em escravos da lei que, como já afirmamos, deveria ser escrava da sociedade.A mencionada jovem ignorante, se processada na forma da lei poderia ser condenada e se fosse presa se tornaria uma pessoa melhor? Nossas prisões recuperam alguém? Queremos transformar uma estudante de Direito, ainda que ignorante em cultura jurídica, em mais uma delinqüente profissional, com curso de pós-graduação na Universidade do Crime?Foi muito simples para o escritório onde ela estava trabalhando livrar-se do assunto: bastou dizer que a dispensaram. E fica a pergunta: ela era um objeto dispensável que pode ser descartado na primeira falha como se fosse um copo trincado? Ora, os nossos colegas quando selecionam uma estagiária devem fazer uma seleção rigorosa. Talvez não tão rigorosa a ponto de verificar conhecimentos culturais mais amplos, mas pelo menos deve ser uma pessoa de boa índole, séria, que não vá causar prejuízos ao escritório.Imaginar que um episódico incidente de preconceito praticado por uma estagiaria possa prejudicar a boa imagem de um escritório é ridículo. Não parece razoável supor que besteira de estagiário na sua vida pessoal e da forma como aqui relatada possa comprometer o escritório em que trabalha.Assim, fica evidente que os advogados que selecionaram a estagiária não estavam preocupados com sua auxiliar. Devemos nos lembrar que qualquer auxiliar de um advogado, seja estagiário, recepcionista ou faxineiro, é, antes de mais nada, uma pessoa, uma criatura humana, que merece nossa compreensão, nossa solidariedade. O estagiário merece mais que isso: precisa ser orientado, instruído, aconselhado. Para isso é que inventaram o estágio, que não é apenas uma forma de arranjar mão de obra mais barata e sem relação de emprego.Com tais considerações, retornamos ao início: o que está acontecendo com os profissionais e os estudantes de Direito?Quanto aos advogados, tudo indica que muitos não estejam percebendo a necessidade de revermos todos os nossos valores, eis que nos encontramos num mundo totalmente diferente daquele onde nossa profissão foi construída.Também é incrível que ainda haja algum colega se imaginando superior a outros, apenas porque ocupou este ou aquele cargo na OAB ou no governo ou porque fez um curso de mestrado ou doutorado ou tenha publicado livros.Todos sabemos que cargos no governo quase sempre ignoram méritos e qualidades do indicado, sendo quase sempre resultado de interesses menores, e que a composição de chapas na OAB também é repleta de defeitos. Títulos acadêmicos não raras vezes são outorgados sem critérios ou mesmo atribuídos a trabalhos sem qualidade que podem até ser comprados aqui ou ali. Publicar livros hoje já não significa quase nada, pois a indústria editorial se tornou uma grande brincadeira, principalmente depois da invenção da internet.Talvez isso explique a preocupação do advogado já mencionado em apresentar-se como demônio, satanás ou belzebu. Muitas pessoas acreditam nessas coisas, cuja credibilidade deve ser maior do que a apresentada por muitos advogados. Parece ser aquela velha história: se eu não posso ser respeitado, tentarei ser temido.A estudante de direito fez uma besteira decorrente de ignorância. Enquadrar isso como crime não leva a nada, além do que os nordestinos provavelmente não estão nem aí com essa bobagem. Ela deveria, quem sabe, sujeitar-se a duas penas: pedir desculpas – se ainda não o fez – e fazer um trabalho escolar resumindo a biografia de mestres do direito que são ou foram nordestinos.Se o advogado quer livrar-se do vício, pode e deve procurar ajuda da OAB ou de quem o possa auxiliar. Se a estudante não gosta de nordestinos demonstra grande ignorância e deve ler um livro. Pode ser um volume só do Tratado de Direito Privado de Pontes de Miranda.Essas questões envolvem ignorância, vaidades mal resolvidas, maldades desnecessárias. A advocacia precisa livrar-se dessas questões. Nossa profissão é séria e defende coisas sérias. O patrimônio, a liberdade e a honra de nossos clientes dependente de nosso trabalho. Não podemos brincar com isso. Não podemos sequer desfrutar de apenas três minutos de insanidade. FONTE: Raul Haidar – www.conjur.com.br/secoes/artigos Submitted by eopen on ter, 17/07/2018 – 16:40 Um advogado e uma estudante de direito foram alvos de notícias estranhas. O primeiro, que já havia declarado ser um demônio, foi entrevistado pela TV confessando ser usuário de entorpecente, enquanto a moça declarou ódio a nordestinos que pretende ver mortos por afogamento.Ambos os casos obrigam-nos a uma reflexão sobre o que está acontecendo com os profissionais e os estudantes de direito, mas isso não implica em tentarmos julgar essas pessoas e nem mesmo – o que seria pior – criticar o destaque que a mídia deu a esses assuntos.Discordamos que se trata de notícia ruim, pois a única notícia ruim é a falsa. A imprensa não tem o direito, mas o dever de divulgar qualquer notícia que lhe pareça útil ou interessante. Uma sociedade só evolui quando pode dispor de qualquer informação, sem censura, sem qualquer conselho, autoridade ou mesmo juiz dizendo o que pode ou não ser divulgado.Aqueles fatos – um advogado ser toxicômano e uma estudante ser preconceituosa – não apresentam isoladamente nenhuma relevância.O uso regular de substâncias capazes de provocar dependência química é uma doença e deve ser tratada como tal através da medicina e da psicologia.A eliminação dos preconceitos talvez seja um processo mais demorado, vez que enraizado na alma da sociedade brasileira, que ainda se comete coisas ridículas e idiotas como falar em nobreza, chamar algumas pessoas de excelência e apelidar de doutor qualquer engravatado. Educação e cultura são coisas muito demoradas.As duas notícias repercutiram de forma que nos pareceu excessivamente burocrática e exageradamente formal. A Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais teria encaminhado o assunto ao Tribunal de Ética, enquanto uma seccional do nordeste pretende ver a estudante preconceituosa criminalmente apenada. O escritório onde ela fazia estágio resolveu dispensá-la. Se ela dependia do estágio para pagar a faculdade, passou a ter mais um problema além da ignorância.Parece-nos que tais questões mereçam ser tratadas com mais serenidade e até mesmo levando-se em conta a possibilidade de ocorrência daquilo que um ministro do STF chamou de “três minutos de insanidade”.Durante a XXVI Reunião de Presidentes de Subseções da OAB-SP, em 1999 em Águas de Lindóia, o então Ministro do STF, Carlos Mário da Silva Velloso, admitindo a hipótese de que votara certa matéria de forma equivocada, afirmou que “…certamente estava naqueles três minutos de insanidade que nós todos, que todo homem, todo dia passa…”.Ora, se um Ministro do Supremo admite que pode decidir questões de grande relevância para a Nação durante esses “três minutos de insanidade” , devemos admitir que advogados e estudantes acham-se sujeitos ao mesmo risco, que é o de passar por três minutos de insanidade todo dia.Dependência química é classificada como doença e nessas condições não pode ser classificada como infração ético-disciplinar. Parece-nos, pois, que um procedimento disciplinar no caso do advogado aqui citado dificilmente possa prosperar.Mas quando um advogado sofre de doença mental ele deve ser licenciado de oficio pela OAB, conforme o artigo 12, inciso III, da lei 8906. Ou seja: ele é afastado da profissão para que se recupere da doença. Cabe observar que a lei fala em doença mental curável, o que pode dar ensejo a discussões, uma vez que a lei tem mais de 16 anos e nesse espaço de tempo houve uma expressiva modificação nas ciências médicas, com o surgimento de medicamentos mais sofisticados e eficazes, o que nos obriga a reconhecer a necessidade de laudos psiquiátricos nesses casos. Doença que não era curável em 1994 talvez o seja hoje.Todavia, ainda que se trate de doença incurável, os direitos do doente devem ser respeitados e antes de mais nada verificado se a doença impede o trabalho, até porque o exercício da atividade quase sempre é ajuda importante no tratamento.De qualquer forma, não podemos nos esquecer que o advogado deve ser assistido e amparado pelos serviços assistenciais da OAB, conforme ordena o artigo 62 do nosso estatuto. Essa assistência deve ser a mais ampla possível, eis que a lei não lhe fixa limites, falando apenas em prestar assistência aos inscritos. Se o advogado tem doença deve ser assistido pela OAB, não disciplinarmente punido. Uma coisa exclui a outra.A história recente da advocacia registra vários casos de minutos de insanidade.Há cerca de dez anos um advogado sofreu vários processos disciplinares, quase sempre por ofensas a magistrados e colegas, quando usava linguagem totalmente incompatível com a profissão. Com algumas suspensões, já se podia antever que teria sua inscrição cancelada pela aplicação do artigo 38 da nossa lei.Mas advocacia e justiça não se limitam a aplicar a lei e esta é instrumento criado pelo homem para ser instrumento de sua felicidade. Não é a criatura humana que está a serviço da lei, mas o contrário.Por outro lado, estamos nos desviando dos princípios básicos da civilização e da declaração universal dos direitos humanos quando, a pretexto de controlar comportamentos, acabamos criminalizando qualquer coisa e transformando quase todas as nossas atitudes em coisas perigosas, que devem ser controladas pelo Grande Pai, o estado…Em face a tais princípios, a OAB-SP, por sugestão do relator do TED naquela ocasião, convidou o advogado para uma reunião, onde este confessou-se doente mental, declarando-se impossiblitado de arcar com as despesas do tratamento. Em face do laudo psiquiátrico reconhecendo a doença como curável, nosso colega foi temporariamente afastado da profissão, a ela retornando mais tarde quando recuperado e hoje trabalha sem problemas.Situação parecida também ocorreu em relação a advogado que voluntariamente se afastou da OAB por estar fazendo tratamento psiquiátrico e que recentemente pleiteou reinscrição eis que já está recuperado. Ou seja: quando acometido de doença mental – consta que dependência química assim se define – tem direito a afastar-se ou deve ser afastado de ofício o profissional que, recuperado, pode voltar ao exercício de seu trabalho. Note-se que não cabe à OAB pretender avaliar a recuperação, que só pode ser feita pelo médico psiquiatra.Outra situação ocorreu quando um jovem pretendia inscrever-se na OAB e teve seu pedido questionado, ao argumento de que fizera ameaças de morte a todos os ministros de STF, as quais teriam sido divulgadas pela internet. Uma situação um pouco parecida com a estudante de direito que não gosta de nordestinos.A inscrição foi concedida por unanimidade pelo Conselho da OAB-SP, que aceitou o parecer do relator, onde este demonstrou que as ameaças não eram sérias, que o pretendente à inscrição era um jovem de boa reputação e que tudo não passara de uma bobagem decorrente dos “… três minutos de insanidade que nós todos, que todo homem, todo dia passa…”.Ora, se todo homem passa, a mulher também passa. Assim, pretender crucificar uma jovem por uma besteira que ela falou ou escreveu, não engrandece ninguém. Não se trata de ignorar a ofensa, de concordar com o preconceito ou estimular tal comportamento. Trata-se de buscar uma solução harmônica, humana, que reconheça a nossa posição de animais racionais, sem que nos coloque na vala comum das bestas vingativas que encontram prazer no sofrimento de nossos semelhantes.No caso da estudante preconceituosa, muito provavelmente ela é duplamente vítima: a) da ignorância que ostenta, resultado do mau ensino que recebeu; e b) da falta de solidariedade e companheirismo de seus colegas de estudo e trabalho.Uma estudante que tivesse tido aulas pelo menos razoáveis teria a obrigação de saber que os maiores juristas, os mais relevantes autores da doutrina jurídica do Brasil, os mais consagrados mestres em todos os campos do direito foram nordestinos ou nortistas: Clovis Bevilacqua (cearense), Rui Barbosa (baiano), Djaci Falcão (paraibano), Pontes de Miranda (alagoano), Hugo de Brito Machado (piauiense) e tantos e tantos outros.A estudante que não sabe disso é culpada? Ora, deveria ser obrigatório o estudo das biografias dos grandes mestres do direito brasileiro. Mas, infelizmente, estuda-se apenas onde colocar o “x” na alternativa certa da prova do concurso. Se há alunos que fingem estudar, há professores que fingem ensinar.Fala-se em processar a estudante por racismo! Essa história de dizer que tudo é crime acaba por nos transformar todos em escravos da lei que, como já afirmamos, deveria ser escrava da sociedade.A mencionada jovem ignorante, se processada na forma da lei poderia ser condenada e se fosse presa se tornaria uma pessoa melhor? Nossas prisões recuperam alguém? Queremos transformar uma estudante de Direito, ainda que ignorante em cultura jurídica, em mais uma delinqüente profissional, com curso de pós-graduação na Universidade do Crime?Foi muito simples para o escritório onde ela estava trabalhando livrar-se do assunto: bastou dizer que a dispensaram. E fica a pergunta: ela era um objeto dispensável que pode ser descartado na primeira falha como se fosse um copo trincado? Ora, os nossos colegas quando selecionam uma estagiária devem fazer uma seleção rigorosa. Talvez não tão rigorosa a ponto de verificar conhecimentos culturais mais amplos, mas pelo menos deve ser uma pessoa de boa índole, séria, que não vá causar prejuízos ao escritório.Imaginar que um episódico incidente de preconceito praticado por uma estagiaria possa prejudicar a boa imagem de um escritório é ridículo. Não parece razoável supor que besteira de estagiário na sua vida pessoal e da forma como aqui relatada possa comprometer o escritório em que trabalha.Assim, fica evidente que os advogados que selecionaram a estagiária não estavam preocupados com sua auxiliar. Devemos nos lembrar que qualquer auxiliar de um advogado, seja estagiário, recepcionista ou faxineiro, é, antes de mais nada, uma pessoa, uma criatura humana, que merece nossa compreensão, nossa solidariedade. O estagiário merece mais que isso: precisa ser orientado, instruído, aconselhado. Para isso é que inventaram o estágio, que não é apenas uma forma de arranjar mão de obra mais barata e sem relação de emprego.Com tais considerações, retornamos ao início: o que está acontecendo com os profissionais e os estudantes de Direito?Quanto aos advogados, tudo indica que muitos não estejam percebendo a necessidade de revermos todos os nossos valores, eis que nos encontramos num mundo totalmente diferente daquele onde nossa profissão foi construída.Também é incrível que ainda haja algum colega se imaginando superior a outros, apenas porque ocupou este ou aquele cargo na OAB ou no governo ou porque fez um curso de mestrado ou doutorado ou tenha publicado livros.Todos sabemos que cargos no governo quase sempre ignoram méritos e qualidades do indicado, sendo quase sempre resultado de interesses menores, e que a composição de chapas na OAB também é repleta de defeitos. Títulos acadêmicos não raras vezes são outorgados sem critérios ou mesmo atribuídos a trabalhos sem qualidade que podem até ser comprados aqui ou ali. Publicar livros hoje já não significa quase nada, pois a indústria editorial se tornou uma grande brincadeira, principalmente depois da invenção da internet.Talvez isso explique a preocupação do advogado já mencionado em apresentar-se como demônio, satanás ou belzebu. Muitas pessoas acreditam nessas coisas, cuja credibilidade deve ser maior do que a apresentada por muitos advogados. Parece ser aquela velha história: se eu não posso ser respeitado, tentarei ser temido.A estudante de direito fez uma besteira decorrente de ignorância. Enquadrar isso como crime não leva a nada, além do que os nordestinos provavelmente não estão nem aí com essa bobagem. Ela deveria, quem sabe, sujeitar-se a duas penas: pedir desculpas – se ainda não o fez – e fazer um trabalho escolar resumindo a biografia de mestres do direito que são ou foram nordestinos.Se o advogado quer livrar-se do vício, pode e deve procurar ajuda da OAB ou de quem o possa auxiliar. Se a estudante não gosta de nordestinos demonstra grande ignorância e deve ler um livro. Pode ser um volume só do Tratado de Direito Privado de Pontes de Miranda.Essas questões envolvem ignorância, vaidades mal resolvidas, maldades desnecessárias. A advocacia precisa livrar-se dessas questões. Nossa profissão é séria e defende coisas sérias. O patrimônio, a liberdade e a honra de nossos clientes dependente de nosso trabalho. Não podemos brincar com isso. Não podemos sequer desfrutar de apenas três minutos de insanidade. FONTE: Raul Haidar – www.conjur.com.br/secoes/artigos Um advogado e uma estudante de direito foram alvos de notícias estranhas. O primeiro, que já havia declarado ser um demônio, foi entrevistado pela TV confessando ser usuário de entorpecente, enquanto a moça declarou ódio a nordestinos que pretende ver mortos por afogamento.Ambos os casos obrigam-nos a uma reflexão sobre o que está acontecendo com os profissionais e os estudantes de direito, mas isso não implica em tentarmos julgar essas pessoas e nem mesmo – o que seria pior – criticar o destaque que a mídia deu a esses assuntos.Discordamos que se trata de notícia ruim, pois a única notícia ruim é a falsa. A imprensa não tem o direito, mas o dever de divulgar qualquer notícia que lhe pareça útil ou interessante. Uma sociedade só evolui quando pode dispor de qualquer informação, sem censura, sem qualquer conselho, autoridade ou mesmo juiz dizendo o que pode ou não ser divulgado.Aqueles fatos – um advogado ser toxicômano e uma estudante ser preconceituosa – não apresentam isoladamente nenhuma relevância.O uso regular de substâncias capazes de provocar dependência química é uma doença e deve ser tratada como tal através da medicina e da psicologia.A eliminação dos preconceitos talvez seja um processo mais demorado, vez que enraizado na alma da sociedade brasileira, que ainda se comete coisas ridículas e idiotas como falar em nobreza, chamar algumas pessoas de excelência e apelidar de doutor qualquer engravatado. Educação e cultura são coisas muito demoradas.As duas notícias repercutiram de forma que nos pareceu excessivamente burocrática e exageradamente formal. A Ordem dos Advogados do Brasil de Minas Gerais teria encaminhado o assunto ao Tribunal de Ética, enquanto uma seccional do nordeste pretende ver a estudante preconceituosa criminalmente apenada. O escritório onde ela fazia estágio resolveu dispensá-la. Se ela dependia do estágio para pagar a faculdade, passou a ter mais um problema além da ignorância.Parece-nos que tais questões mereçam ser tratadas com mais serenidade e até mesmo levando-se em conta a possibilidade de ocorrência daquilo que um ministro do STF chamou de “três minutos de insanidade”.Durante a XXVI Reunião de Presidentes de Subseções da OAB-SP, em 1999 em Águas de Lindóia, o então Ministro do STF, Carlos Mário da Silva Velloso, admitindo a hipótese de que votara certa matéria de forma equivocada, afirmou que “…certamente estava naqueles três minutos de insanidade que nós todos, que todo homem, todo dia passa…”.Ora, se um Ministro do Supremo admite que pode decidir questões de grande relevância para a Nação durante esses “três minutos de insanidade” , devemos admitir que advogados e estudantes acham-se sujeitos ao mesmo risco, que é o de passar por três minutos de insanidade todo dia.Dependência química é classificada como doença e nessas condições não pode ser classificada como infração ético-disciplinar. Parece-nos, pois, que um procedimento disciplinar no caso do advogado aqui citado dificilmente possa prosperar.Mas quando um advogado sofre de doença mental ele deve ser licenciado de oficio pela OAB, conforme o artigo 12, inciso III, da lei 8906. Ou seja: ele é afastado da profissão para que se recupere da doença. Cabe observar que a lei fala em doença mental curável, o que pode dar ensejo a discussões, uma vez que a lei tem mais de 16 anos e nesse espaço de tempo houve uma expressiva modificação nas ciências médicas, com o surgimento de medicamentos mais sofisticados e eficazes, o que nos obriga a reconhecer a necessidade de laudos psiquiátricos nesses casos. Doença que não era curável em 1994 talvez o seja hoje.Todavia, ainda que se trate de doença incurável, os direitos do doente devem ser respeitados e antes de mais nada verificado se a doença impede o trabalho, até porque o exercício da atividade quase sempre é ajuda importante no tratamento.De qualquer forma, não podemos nos esquecer que o advogado deve ser assistido e amparado pelos serviços assistenciais da OAB, conforme ordena o artigo 62 do nosso estatuto. Essa assistência deve ser a mais ampla possível, eis que a lei não lhe fixa limites, falando apenas em prestar assistência aos inscritos. Se o advogado tem doença deve ser assistido pela OAB, não disciplinarmente punido. Uma coisa exclui a outra.A história recente da advocacia registra vários casos de minutos de insanidade.Há cerca de dez anos um advogado sofreu vários processos disciplinares, quase sempre por ofensas a magistrados e colegas, quando usava linguagem totalmente incompatível com a profissão. Com algumas suspensões, já se podia antever que teria sua inscrição cancelada pela aplicação do artigo 38 da nossa lei.Mas advocacia e justiça não se limitam a aplicar a lei e esta é instrumento criado pelo homem para ser instrumento de sua felicidade. Não é a criatura humana que está a serviço da lei, mas o contrário.Por outro lado, estamos nos desviando dos princípios básicos da civilização e da declaração universal dos direitos humanos quando, a pretexto de controlar comportamentos, acabamos criminalizando qualquer coisa e transformando quase todas as nossas atitudes em coisas perigosas, que devem ser controladas pelo Grande Pai, o estado…Em face a tais princípios, a OAB-SP, por sugestão do relator do TED naquela ocasião, convidou o advogado para uma reunião, onde este confessou-se doente mental, declarando-se impossiblitado de arcar com as despesas do tratamento. Em face do laudo psiquiátrico reconhecendo a doença como curável, nosso colega foi temporariamente afastado da profissão, a ela retornando mais tarde quando recuperado e hoje trabalha sem problemas.Situação parecida também ocorreu em relação a advogado que voluntariamente se afastou da OAB por estar fazendo tratamento psiquiátrico e que recentemente pleiteou reinscrição eis que já está recuperado. Ou seja: quando acometido de doença mental – consta que dependência química assim se define – tem direito a afastar-se ou deve ser afastado de ofício o profissional que, recuperado, pode voltar ao exercício de seu trabalho. Note-se que não cabe à OAB pretender avaliar a recuperação, que só pode ser feita pelo médico psiquiatra.Outra situação ocorreu quando um jovem pretendia inscrever-se na OAB e teve seu pedido questionado, ao argumento de que fizera ameaças de morte a todos os ministros de STF, as quais teriam sido divulgadas pela internet. Uma situação um pouco parecida com a estudante de direito que não gosta de nordestinos.A inscrição foi concedida por unanimidade pelo Conselho da OAB-SP, que aceitou o parecer do relator, onde este demonstrou que as ameaças não eram sérias, que o pretendente à inscrição era um jovem de boa reputação e que tudo não passara de uma bobagem decorrente dos “… três minutos de insanidade que nós todos, que todo homem, todo dia passa…”.Ora, se todo homem passa, a mulher também passa. Assim, pretender crucificar uma jovem por uma besteira que ela falou ou escreveu, não engrandece ninguém. Não se trata de ignorar a ofensa, de concordar com o preconceito ou estimular tal comportamento. Trata-se de buscar uma solução harmônica, humana, que reconheça a nossa posição de animais racionais, sem que nos coloque na vala comum das bestas vingativas que encontram prazer no sofrimento de nossos semelhantes.No caso da estudante preconceituosa, muito provavelmente ela é duplamente vítima: a) da ignorância que ostenta, resultado do mau ensino que recebeu; e b) da falta de solidariedade e companheirismo de seus colegas de estudo e trabalho.Uma estudante que tivesse tido aulas pelo menos razoáveis teria a obrigação de saber que os maiores juristas, os mais relevantes autores da doutrina jurídica do Brasil, os mais consagrados mestres em todos os campos do direito foram nordestinos ou nortistas: Clovis Bevilacqua (cearense), Rui Barbosa (baiano), Djaci Falcão (paraibano), Pontes de Miranda (alagoano), Hugo de Brito Machado (piauiense) e tantos e tantos outros.A estudante que não sabe disso é culpada? Ora, deveria ser obrigatório o estudo das biografias dos grandes mestres do direito brasileiro. Mas, infelizmente, estuda-se apenas onde colocar o “x” na alternativa certa da prova do concurso. Se há alunos que fingem estudar, há professores que fingem ensinar.Fala-se em processar a estudante por racismo! Essa história de dizer que tudo é crime acaba por nos transformar todos em escravos da lei que, como já afirmamos, deveria ser escrava da sociedade.A mencionada jovem ignorante, se processada na forma da lei poderia ser condenada e se fosse presa se tornaria uma pessoa melhor? Nossas prisões recuperam alguém? Queremos transformar uma estudante de Direito, ainda que ignorante em cultura jurídica, em mais uma delinqüente profissional, com curso de pós-graduação na Universidade do Crime?Foi muito simples para o escritório onde ela estava trabalhando livrar-se do assunto: bastou dizer que a dispensaram. E fica a pergunta: ela era um objeto dispensável que pode ser descartado na primeira falha como se fosse um copo trincado? Ora, os nossos colegas quando selecionam uma estagiária devem fazer uma seleção rigorosa. Talvez não tão rigorosa a ponto de verificar conhecimentos culturais mais amplos, mas pelo menos deve ser uma pessoa de boa índole, séria, que não vá causar prejuízos ao escritório.Imaginar que um episódico incidente de preconceito praticado por uma estagiaria possa prejudicar a boa imagem de um escritório é ridículo. Não parece razoável supor que besteira de estagiário na sua vida pessoal e da forma como aqui relatada possa comprometer o escritório em que trabalha.Assim, fica evidente que os advogados que selecionaram a estagiária não estavam preocupados com sua auxiliar. Devemos nos lembrar que qualquer auxiliar de um advogado, seja estagiário, recepcionista ou faxineiro, é, antes de mais nada, uma pessoa, uma criatura humana, que merece nossa compreensão, nossa solidariedade. O estagiário merece mais que isso: precisa ser orientado, instruído, aconselhado. Para isso é que inventaram o estágio, que não é apenas uma forma de arranjar mão de obra mais barata e sem relação de emprego.Com tais considerações, retornamos ao início: o que está acontecendo com os profissionais e os estudantes de Direito?Quanto aos advogados, tudo indica que muitos não estejam percebendo a necessidade de revermos todos os nossos valores, eis que nos encontramos num mundo totalmente diferente daquele onde nossa profissão foi construída.Também é incrível que ainda haja algum colega se imaginando superior a outros, apenas porque ocupou este ou aquele cargo na OAB ou no governo ou porque fez um curso de mestrado ou doutorado ou tenha publicado livros.Todos sabemos que cargos no governo quase sempre ignoram méritos e qualidades do indicado, sendo quase sempre resultado de interesses menores, e que a composição de chapas na OAB também é repleta de defeitos. Títulos acadêmicos não raras vezes são outorgados sem critérios ou mesmo atribuídos a trabalhos sem qualidade que podem até ser comprados aqui ou ali. Publicar livros hoje já não significa quase nada, pois a indústria editorial se tornou uma grande brincadeira, principalmente depois da invenção da internet.Talvez isso explique a preocupação do advogado já mencionado em apresentar-se como demônio, satanás ou belzebu. Muitas pessoas acreditam nessas coisas, cuja credibilidade deve ser maior do que a apresentada por muitos advogados. Parece ser aquela velha história: se eu não posso ser respeitado, tentarei ser temido.A estudante de direito fez uma besteira decorrente de ignorância. Enquadrar isso como crime não leva a nada, além do que os nordestinos provavelmente não estão nem aí com essa bobagem. Ela deveria, quem sabe, sujeitar-se a duas penas: pedir desculpas – se ainda não o fez – e fazer um trabalho escolar resumindo a biografia de mestres do direito que são ou foram nordestinos.Se o advogado quer livrar-se do vício, pode e deve procurar ajuda da OAB ou de quem o possa auxiliar. Se a estudante não gosta de nordestinos demonstra grande ignorância e deve ler um livro. Pode ser um volume só do Tratado de Direito Privado de Pontes de Miranda.Essas questões envolvem ignorância, vaidades mal resolvidas, maldades desnecessárias. A advocacia precisa livrar-se dessas questões. Nossa profissão é séria e defende coisas sérias. O patrimônio, a liberdade e a honra de nossos clientes dependente de nosso trabalho. Não podemos brincar com isso. Não podemos sequer desfrutar de apenas três minutos de insanidade. FONTE: Raul Haidar – www.conjur.com.br/secoes/artigos

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