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Suspensão do Prazo Prescricional

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Home Artigos jurídicos Suspensão do Prazo Prescricional Suspensão do Prazo Prescricional Home Artigos jurídicos Suspensão do Prazo Prescricional Suspensão do Prazo Prescricional Submitted by eopen on ter, 17/07/2018 – 18:32 Por Leandro Salerno Leyser de AquinoOrientado pelo Prof. Danilo Augusto Ferreira I- Introdução. A lei 9.271, de 17 de Abril de 1.996, alterou os artigos 366, 367, 368 e 370 do Decreto-lei nº 3.689, de 03 de Outubro de 1.941 (Código de Processo Penal), e nos termos do seu artigo 2º, entrou em vigor sessenta dias após a sua publicação, ou seja, em 17 de junho de 1.996. Posteriormente, a lei 11.719, de 20 de Junho de 2.008, entre outras coisas, suprimiu os parágrafos 1º e 2º do art. 366, também do Código de Processo Penal. Dentre as alterações supra citadas, nos interessa o estudo daquelas referentes aos artigos 366 e 368 do referido diploma legal, especificamente no tocante à “suspensão do prazo prescricional”, uma vez que, nestes artigos foram criadas duas causas de suspensão da prescrição. II- Histórico da Suspensão do Prazo Prescricional. A suspensão da prescrição é um instituto que nasceu no Código Penal de 1.940, como ensina Eduardo Reale Ferrari[1], “nomeadamente no Brasil, a primeira codificação penal disciplinando as causas suspensivas da prescrição da ação surgiu com o advento do Código Penal de 1.940, que em seu artigo 116 enunciou duas causas suspensivas”. Essas duas causas citadas vieram previstas nos incisos I e II do artigo 116 do Código Penal, assim enunciadas: “Art. 116 – Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I- enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime; II- enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro;” Com o advento da reforma da parte geral do Código Penal, através da Lei nº 7.209, de 11/07/1.984, as duas causas suspensivas citadas foram mantidas e ainda foi criada mais uma, expressa em um parágrafo único, a saber: “Parágrafo único. Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo”. Estas causas de suspensão do processo no Código Penal não foram mais alteradas até os dias de hoje. No tocante às causas de suspensão da prescrição introduzidas pela Lei nº 9.271/96, elas derivam do preceito exposto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (ratificado pelo Decreto 678/92), que assegura a ‘citação pessoal como exigência do devido processo legal’[2]. Assim, atualmente, além das causas de suspensão da prescrição que serão estudadas neste trabalho, existem aquelas previstas no Código Penal, supra citadas, bem como nos artigos 89, parágrafo 6º, da Lei nº 9.099/95, e 53, parágrafo 2º, da Constituição Federal.   III- Prescrição – Suspensão – Conceitos.   Segundo Basileu Garcia[3], “a prescrição é a renúncia do Estado a punir a infração, em face do decurso de tempo”. Prosseguindo, o mesmo autor[4] esclarece, quanto à suspensão da prescrição, a saber: “caracteriza as causas suspensivas o aparecimento de um obstáculo à ação repressora, que, forçosamente, se detém. Mas a inatividade é justificada. Por isso, não há cogitar de prescrição durante o tempo em que perdura o impedimento. O tempo anterior a êsse hiato soma-se ao posterior, em benefício do réu, porque a inação, antes e depois do interregno, não tem justificativa”. Segundo Damásio E. de Jesus[5], “prescrição penal é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do tempo sem o seu exercício”. No tocante à suspensão do processo, ensina Damásio[6]:“Na suspensão da prescrição o tempo decorrido antes da causa é computado no prazo; na interrupção, o tempo decorrido antes da causa não é computado no prazo, que recomeça a correr por inteiro. Em outros termos: cessado o efeito da causa suspensiva, a prescrição recomeça a correr, computando-se o tempo decorrido antes dela; interrompida a prescrição, o prazo recomeça a correr por inteiro”.    IV- Da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal. Com o advento da Lei nº 9.271/96 o artigo 366 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redação: “Art. 366 – Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. §1º. As provas antecipadas serão produzidas na presença do Ministério Público e do defensor dativo (Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008). §2º. Comparecendo o acusado, ter-se-á por citado pessoalmente, prosseguindo o processo em seus ulteriores atos (Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008).”   Pois bem, estabeleceu a lei acima citada que, se o réu, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional. Portanto, a decisão de suspensão do prazo prescricional vem acompanhada da de suspensão do processo, devendo, logicamente, esta preceder aquela, embora ambas tomadas no mesmo momento processual. É importante consignar, a título de informação, uma exceção já existente, no sentido da não aplicabilidade expressa do artigo 366 do Código de Processo Penal, prevista na Lei nº 9.613/98, que dispõe sobre os crimes de ‘lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores’.    V- Requisitos para a Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal. Pela leitura no novo texto legal referido, podemos concluir que, para a suspensão do processo e do “prazo prescricional” são necessários os seguintes requisitos:   a-   Que o réu seja citado por edital; b-   Que o réu, embora citado por edital, não compareça em Juízo; c-   Que o réu, embora citado por edital e não comparecendo em Juízo, não constitua advogado.   O primeiro requisito é que o réu tenha sido citado fictamente, ou de forma presumida. No processo penal, a única forma de citação ficta é a citatio edictalis, ou seja, a citação por edital. É ficta ou presumida a citação porque, não tendo sido feita na própria pessoa do réu, presume-se, por meio da respectiva publicação na imprensa oficial ou afixação do edital no átrio do Fórum, que ele tenha tomado conhecimento da acusação que lhe está sendo imputada em Juízo e do respectivo chamamento para interrogatório. O segundo consiste em, embora citado fictamente, não compareça o réu em Juízo, para ser interrogado, ou seja, em se tornar revel, ignorando o chamamento a Juízo. O último requisito é que, citado fictamente e revel, não constitua o réu advogado. Tais requisitos são extraídos da própria lei e são cumulativos, e não alternativos, vale dizer, deverão estar presentes concomitantemente para que o magistrado, a requerimento das partes ou de ofício, determine expressamente, uma vez que não decorre automaticamente da lei, após decretar a revelia do réu, a suspensão do andamento processual e do respectivo prazo prescricional. Quanto aos requisitos citados, não há divergência na doutrina. Entretanto, existem inúmeras discussões doutrinárias quanto ao “prazo em que a prescrição pode ficar suspensa” e quanto à “retroatividade ou não do referido artigo de lei”.   VI- Período de Incidência da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, atendidos aos requisitos supra,  como já dito, junto com a suspensão do processo deve vir a suspensão do prazo prescricional. Contudo, o legislador falhou ao “não prever qual o período em que a suspensão do prazo prescricional poderia incidir”, e por isso, uma interpretação literal da lei, poderia acarretar, em tese, a uma hipótese de crime imprescritível, ao se concluir que o “prazo prescricional” ficaria suspenso “até o comparecimento do réu em Juízo”, em outras palavras, se o réu nunca comparecesse em Juízo, nunca o respectivo crime prescreveria. Ocorre que a Constituição Federal previu expressamente quais as duas ‘únicas’ hipóteses de crimes imprescritíveis, a saber: crime de “racismo” (artigo 5º, inciso XLII) e de “grupos armados contra o Estado de Direito” (artigo 5º, inciso XLIV), e não autorizou ao legislador infra-constitucional a criação de nenhuma outra. Logo, fica claro que a interpretação que cria a hipótese de crime imprescritível é inconstitucional, daí termos que admitir que a melhor interpretação ao texto legal referido é a de que há limite temporal para a incidência da “suspensão do prazo prescricional”. Esse limite temporal me parece coerente como sendo aquele defendido por Damásio E. de Jesus[7], no sentido de que “o limite da suspensão do curso prescricional corresponde aos prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena privativa de liberdade imposta abstratamente”. Prossegue o autor afirmando que “se cominada abstratamente somente pena de multa, como em algumas contravenções, considera-se o prazo de dois anos (CP, art. 114, I)”. Sobre o assunto ensina o mestre Luiz Flávio Gomes[8], a saber: “A única interpretação (e aplicação) constitucionalmente válida que se pode adotar em relação à Lei nº 9.271/96, na questão relacionada com a suspensão do prazo prescricional, consiste em reconhecer, no ato da suspensão do processo, que aquela (suspensão da prescrição) vige por tempo determinado, por tempo certo e limitado, que deve corresponder, no nosso modo de entender, a ‘um período prescricional’ (pena máxima em abstrato combinada com o art. 109 do CP). Dito de outra maneira: durante um ‘período prescricional’ (computado pela pena em abstrato combinada com o art. 109 do CP) não corre a prescrição. Mas, terminado esse período, o prazo prescricional que estava em andamento retoma o seu curso (note-se: retoma o curso, pois estamos diante de causa ‘suspensiva’, não interruptiva; logo, o tempo que transcorreu antes da suspensão do processo não desaparece, é válido e deve ser computado).  Assim interpretada a Lei nº 9.271/96, assegura-se a intangibilidade do ‘direito à prescritibilidade’, que possui, aliás, como visto, cunho constitucional”. Posição um pouco diversa das acima citadas é a de Fernando da Costa Tourinho Filho[9], que entende que: “Sem embargo de entendimento contrário (RT, 733/600), essa suspensão do curso da prescrição por prazo indeterminado, melhor refletindo, não implica ‘imprescritibilidade de conduta’, ao contrário daquelas hipóteses tratadas na Lei Maior. Os crimes a que se refere a Constituição Federal, naqueles incisos do art. 5º, sim, são imprescritíveis. Já as infrações praticadas por aqueles citados por edital que não acudirem à ‘in jus vocatio’ nem constituírem Advogado, não. Não e renão. É o prazo prescricional que fica suspenso se, citado por edital, não atender ao chamado. É diferente das hipóteses cuidadas na Lei das Leis. Ali é o crime que é imprescritível: antes, durante ou após a instauração do processo. Aqui, no CPP, a prescrição fica suspensa se, citado por edital, não comparecer nem constituir defensor. A diferença é bem grande. … A hipótese tratada no art. 366 não é símile daquelas previstas no texto da Lei Maior. Se o réu, a teor do art. 366, foi citado por edital, não atendeu ao chamado, mas constituiu Advogado; se foi citado pessoalmente, e não atendeu ao chamado; se atendeu e depois deixou o processo à revelia, em todas essas hipóteses não há cuidar-se de imprescritibilidade. Se, em qualquer desses casos, vier a ser condenado, e não for encontrado para o cumprimento da pena, a prescrição será regulada pela pena imposta. Logo, não se pode estabelecer, ‘data venia’, comparação entre a imprescritibilidade a que se refere o art. 366 do CPP com a tratada no corpo da Lei Básica”. Entretanto, este último autor, embora entenda que o art. 366 não criou uma ‘imprescritibilidade de conduta’, admitiu que o legislador foi ‘por demais severo’, propondo que o mesmo deveria ter previsto que[10]: “O processo ficaria suspenso, com a produção antecipada das provas de natureza urgente, notadamente a testemunhal e a pericial, ‘como dever do Juiz’ (e não como mera faculdade, …), suspender-se-ia, também, o curso da prescrição até o limite máximo fixado para a espécie pelo art. 109 do CP. Findo o prazo, considerada a pena em abstrato, a prescrição voltaria a fluir, observadas as regras dos arts. 109, 110 e 117 do CP. Ou que se fixasse em dobro o prazo prescricional para essas hipóteses, da mesma forma que se fixou pela metade o lapso prescricional para os menores de 21 e maiores de 70 anos. Outra solução: a prescrição fluiria normalmente, mas o revel não faria jus à prescrição retroativa”. Ainda que se admita que realmente a Lei nº 9.271/96, ao alterar o artigo 366 do Código de Processo Penal, não “criou crimes imprescritíveis”, até porque não criou ‘tipos penais’, não se pode negar também que acabou por  “criar situações jurídicas que podem levar qualquer delito à imprescritibilidade”, desde que o acusado, citado por edital, nunca compareça em Juízo e nunca constitua advogado, hipótese em que o delito que lhe foi imputado nunca prescreverá. Em que pese Fernando da Costa Tourinho Filho ter defendido a tese de ‘não criação de imprescritibilidade’, por parte da alteração introduzida no artigo 366 do Código de Processo Penal, pela lei citada, a verdade é que, dentre as hipóteses que sugeriu, como solução, está aquela adotada pelos autores Damásio E. de Jesus e Luiz Flávio Gomes, no sentido de que a suspensão do prazo prescricional seja limitada, nos termos do artigo 109 do Código Penal, considerando a pena máxima em abstrato para o delito. Assim, em harmonia com uma das sugestões do autor Tourinho Filho e com os entendimentos dos autores Damásio de Jesus e Luiz Flávio Gomes, entendo que a melhor solução a ser adotada ao caso é a de se considerar como ‘limitado’ o período de incidência da suspensão do prazo prescricional, limitação esta que deverá ter por base a pena máxima prevista em abstrato para o delito e os prazos estabelecido no artigo 109 do Código Penal. Portanto, determinado pelo magistrado a suspensão do andamento do processo e do respectivo prazo prescricional, há que ser estabelecido, já na decisão citada, que essa “suspensão da prescrição” perdurará pelo limite supra citado.   VII- Retroatividade ou não da Lei nº 9.271/96, em face das alterações efetuadas no artigo 366 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, a lei supra criou, no artigo 366 do Código de Processo Penal, dois institutos novos, o da “suspensão do processo” e o da “suspensão do prazo prescricional”. O primeiro é de índole processual e o segundo de índole penal, daí as divergências, quanto ao momento de suas aplicações, isto porque, o instituto de direito processual penal tem aplicação imediata, nos termos do artigo 2º do Código de Processo Penal, o que significa dizer que, pode ser aplicado imediatamente aos processos em andamento, mesmo referente a fatos praticados anteriormente à  vigência da lei que o contém. Já o instituto de direito penal só pode ter aplicação imediata, aos processos em andamento, nas hipóteses em que não prejudicar o réu, nos termos do preceito constitucional previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, vale dizer, só pode alcançar fatos praticados antes da vigência da lei que o contém quando for para beneficiar o réu. Diante disso, criou-se pelo menos três correntes diferentes, referentes à aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, a saber:    a-   Da irretroatividade total; b-   Da retroatividade total; c-   Da retroatividade parcial;   Quanto à primeira corrente, defendem-na, dentre outros, o Prof. Damásio E. de Jesus[11], nos seguintes termos: “A norma do art. 366, ‘caput’, do CPP, na parte em que determina a suspensão do processo, tem natureza processual penal, uma vez que disciplina o ‘desenvolvimento do processo’. Quando, entretanto, prevê a suspensão do prazo prescricional, é de direito penal material. Temos, então, uma disposição mista, impondo princípios de direito substantivo e processual. Quando isso ocorre, prevalece a natureza penal. E assim convém, uma vez que a suspensão do processo gera, fatalmente, o impedimento do decurso prescricional. O juiz, nos termos da nova legislação, sobrestando o processo, provoca automaticamente a suspensão do lapso prescricional, proibindo que o feito se dirija à extinção da punibilidade. Não se pode, pois, dissociar as duas formas de suspensão, a do processo e da prescrição, para se conferir à lei incidência imediata no que tange ao sobrestamento da ação penal (CPP, art. 2º) e efeito irretroativo na parte em que impõe a suspensão da prescrição (CP, art. 2º, parágrafo único). A suspensão do prazo prescricional em face do sobrestamento da ação penal era desconhecida em nossa legislação. Logo, o art. 366, nesse ponto, é mais gravoso que o ordenamento legal anterior (novatio legis in pejus). Deve ser, por isso, irretroativo, não se aplicando às infrações penais cometidas antes da vigência da lei (CF, art. 5º, XL; CP, art. 2º, parágrafo único). Com relação à segunda corrente, defendem-na, dentre outros, Luiz Flávio Gomes[12], a saber: “Admitindo-se algum ‘limite’ (quanto ao prazo da suspensão prescricional), já não se pode dizer que a nova lei tenha criado uma ‘situação de imprescritibilidade’ (eterna). … Assim enfocada a nova lei, não parece desarrazoada a tese da sua retroatividade total (parte processual e parte penal), mesmo porque caberia considerar o seguinte: em todas as hipóteses legais de suspensão do prazo prescricional ( … ) dá-se o advento de uma situação nova ‘posterior’ ao delito. A causa suspensiva do prazo prescricional ( … ) sempre surge depois do delito. A suspensão do prazo, nessas hipóteses, significa indiscutivelmente um certo prejuízo para o acusado, mas é uma imposição (proporcional) para se estabelecer um ‘equilíbrio de armas’. Se o Estado, pelas razões supra-indicadas, não pode exercitar temporariamente a persecução penal (não pode, em outras palavras, ‘fazer andar o processo’), tampouco parece justo que seja ‘punido’ com o transcurso do tempo. Assim considerada a questão, não tem relevância que a causa suspensiva tenha por base uma lei precedente ou venha inserida no contexto de uma lei nova. … No fundo, o que temos em conflito são dois direitos fundamentais do acusado: de um lado o direito de autodefesa, como expressão do devido processo legal, contraditório, ampla defesa etc.; de outro, o direito de não ser prejudicado por uma lei ‘penal’ nova. Urge a ponderação desses valores. … A teoria da proporcionalidade, que entra em cena sempre que vários direitos fundamentais estão em conflito, é extremamente útil para dar-nos uma luz ao complexo problema em questão. Concluindo, se ‘limitado’ o prazo de suspensão da prescrição (prazo certo, determinado), pode ser sustentável a tese da retroatividade total da lei (tanto na sua parte processual, como penal)”. No tocante à terceira corrente, defendem-na, dentre outros, Fernando da Costa Tourinho Filho[13], da seguinte forma: “O diploma legal em exame, ao determinar a ‘suspensão do processo’, deve ter tido incidência imediata, isto é, a partir de 17-6-1996, quando se expirou a ‘vacatio legis’, nos termos do artigo 2º do CPP, porquanto se trata de norma processual penal. … Mas, ao estabelecer a ‘suspensão do curso da prescrição’, a matéria é indiscutivelmente de natureza penal, subordinando-se às regras da temporalidade das normas penais. … E, considerando que o art. 5º, XL, da Lei Maior prescreve que ‘a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu’, parece claro que o diploma em análise, no seu aspecto penal, somente poderá ser aplicado às infrações que se verificaram a partir do dia 17 de junho de 1996, data em que começou a vigorar a Lei nº 9.271, de 17-4-1996”. Prossegue o mesmo autor[14] esclarecendo que: “Se se tratasse de um ‘instituto’ de aspecto duplo (penal e processual penal), tal como ocorre com a ‘representação’ e a ‘queixa’, que apresentam prevalentes caracteres penais, pela sua natural conexão com o direito penal material, aplicar-se-lhe-ia o princípio da irretroatividade. Na hipótese, não se trata de um instituto, mas de uma norma que cuida, num só contexto, de duas coisas distintas, apresentando, assim, uma natureza dúplice: penal e processual. Em face dessa duplicidade, não se pode, a nosso juízo, dar prevalência a uma ou a outra natureza. Assim, aos processos em curso, se houve citação-edital e o réu não constituiu Advogado, cumpre ao Juiz suspender apenas o curso do procedimento. … Insista-se: a suspensão do lapso prescricional somente será possível quando se tratar de infração cometida do dia 17 de junho de 1996 para a frente”. Dentre as correntes doutrinárias apresentadas, entendo que a mais convincente é que prevê a ‘irretroatividade total’ do artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, isto porque, julgo imbatível o argumento de que, trazendo a lei a ‘suspensão do prazo prescricional’, que não existia anteriormente no citado artigo, se trata de uma novatio legis in pejus, e como tal, não pode retroagir para atingir fatos praticados antes de sua vigência, sob pena de ferir o preceito constitucional do artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e a previsão legal do artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal. Quanto à corrente da ‘retroatividade total’ fica claro que a mesma esbarra nos preceitos constitucional e legal supra citados, que impedem a retroação da lei para prejudicar o réu, razão pela qual deve ser afastada. Com referência à corrente da ‘retroatividade parcial’, entendo também deva a mesma ser afastada, uma vez que não vejo justificativa legal para que se possa ‘cindir’ uma lei e aplicá-la apenas em parte, vale dizer, o magistrado iria aplicar parte de uma lei e, obviamente, parte de outra, o que implicaria, na prática, em criar uma nova lei, com partes extraídas das outras duas. Tal conduta, com certeza, fere o princípio constitucional da Independência dos Poderes, previsto no artigo 2º da Constituição Federal, uma vez que não compete ao Poder Judiciário elaborar (criar) leis. Portanto, o artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, só deve ser aplicado a fatos praticados já na vigência desta.   VIII- Da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal. Com o advento da Lei nº 9.271/96 o artigo 368 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redação: “Art. 368 – Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento.” Pois bem, estabeleceu a lei acima citada que, se o réu estiver no estrangeiro, em lugar conhecido, será citado por rogatória, independentemente do delito ser afiançável ou não (antes da Lei nº 9.271/96 a citação por rogatória era apenas na hipótese de crime inafiançável), ficando suspenso o prazo prescricional até o cumprimento da carta.   IX- Requisitos para a Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal. Pela leitura no novo texto legal referido, podemos concluir que, para a suspensão do “prazo prescricional” são necessários os seguintes requisitos:   a-  Que o réu esteja no estrangeiro; b-  Que o réu, no estrangeiro, esteja em lugar conhecido;   O primeiro requisito é que o réu esteja no estrangeiro, vale dizer, fora do nosso país. O outro requisito é que, embora no estrangeiro, seja conhecido o local onde se encontra, ou seja, seja conhecido o seu endereço, pois a citação, ainda que por rogatória, não vai deixar de ser “pessoal”. Tais requisitos são extraídos da própria lei e são cumulativos, e não alternativos, vale dizer, deverão estar presentes concomitantemente para que o magistrado determine a expedição de carta rogatória para citação do acusado e, consequentemente, fique suspenso o prazo prescricional. Quanto aos requisitos citados, não há divergência na doutrina. Entretanto, existem aqui também inúmeras discussões doutrinárias quanto ao “prazo em que a prescrição pode ficar suspensa”, embora tenha sido previsto, de forma insatisfatória, ‘até o seu cumprimento (da carta rogatória)’, e quanto à “retroatividade ou não do artigo de lei referido”.   X- Período de Incidência da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, atendidos aos requisitos supra,  como já dito, deverá ser suspenso o prazo prescricional.  Contudo, o legislador falhou mais uma vez ao “não prever, de forma clara, qual o período em que a suspensão do prazo prescricional poderia incidir”, uma vez que, embora tenha estabelecido um termo para a suspensão da prescrição, “até o cumprimento da carta rogatória”, este foi muito vago, podendo significar, mais uma vez, atendendo a uma interpretação literal da lei, em tese, a hipótese de crime imprescritível, pois se a rogatória referida nunca retornar, nunca o respectivo crime prescreverá. Assim, reitera-se aqui tudo o que foi dito no “item VI”, quanto ao limite do período de incidência da suspensão do prazo prescricional, bem como que este limite deve estar previsto na decisão que determinar a citada suspensão.   XI- Retroatividade ou não da Lei nº 9.271/96, em face das alterações efetuadas no artigo 368 do Código de Processo Penal – Conclusão.   A lei supra criou, no artigo 368 do Código de Processo Penal, um instituto novo, referente à “suspensão do prazo prescricional”. Tal instituto é de direito penal substantivo e, como tal, só pode ter aplicação imediata, aos processos em andamento, na hipótese em que não prejudicar o réu, nos termos do preceito constitucional previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e do artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, vale dizer, só pode alcançar fatos praticados antes da vigência da lei que o contém quando for para beneficiar o réu. Contudo, a ‘suspensão do prazo prescricional’, prevista no artigo supra, é, sem dúvida, algo novo que veio em prejuízo do réu, portanto, se trata de uma novatio legis in pejus, e, assim sendo, não poderá retroagir para alcançar fatos praticados antes de sua vigência. Logo, o artigo 368 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, só deve ser aplicado a fatos praticados já na vigência desta.   XII- Jurisprudência – Conclusão.   No tocante à jurisprudência é oportuno citarmos a conclusão extraída do artigo escrito pelo eminente magistrado José Renato Nalini[15], que fez um apanhado sobre a tendência do TACrim/SP, referente às inovações da Lei nº 9.271/96, citando inúmeros julgados, a saber: “Até o momento, delineia-se, no maior e mais especializado Tribunal do Brasil, uma tendência a se considerá-la: a)‘constitucional’, ou seja, compatível com a ordem fundante; b) de ‘aplicação irretroativa’ para os crimes praticados antes de sua vigência, diante da natureza mista de norma a um tempo material e processual; c) ‘insuscetível de cisão’, ou seja, inviável a aplicação da parte considerada benéfica e a inaplicação da parte prejudicial ao réu; d) a ‘prisão preventiva não é conseqüência necessária do decreto de revelia’; e) a ‘produção antecipada de prova está confiada ao prudente arbítrio do Juiz em cada caso concreto’ e f) o recurso cabível da decisão que suspende o processo é o ‘recurso em sentido estrito’.  Outras questões ainda estão a suscitar dúvidas. O ‘prazo prescricional’ a ser observado, a partir de integral vigência da Lei, não encontra unanimidade na doutrina e jurisprudência. Dentre as opções possíveis, parece razoável a orientação que remete ao ‘caput’ do art. 109 do CP. O máximo da pena privativa de liberdade prevista para o crime é que passaria a ser considerado no cálculo desse lapso”. Portanto, dentro do tema do nosso trabalho, podemos observar que a jurisprudência tem se voltado no sentido das conclusões já explanadas em cada item acima, especificamente no sentido da “irretroatividade da lei” e, consequentemente, de sua não cisão, bem como de se estabelecer um “limite ao prazo da suspensão do processo”, que pode ser o previsto no artigo 109 do Código Penal, considerando a pena máxima prevista em abstrato para o delito.   XIII- Conclusão final. O legislador teve boa intenção, com a Lei nº 9.271/96, ao estatuir que o processo não poderia prosseguir sem a presença do acusado ou seu defensor constituído, suspendendo a prescrição, presumindo o desconhecimento daquele sobre os fatos que lhe estão sendo imputados, dando ênfase, dentre outros, aos princípios constitucionais da ‘ampla defesa’, ‘devido processo legal’ e ‘contraditório’. No dizer de René Ariel Dotti[16] “o grande desafio proposto pelo novo diploma consiste no empenho de resgatar a participação da imensa legião de pessoas que vive à margem do processo. Ela é composta pelos réus desaparecidos. Geralmente são os deserdados do testamento de Adão, nômades à procura de emprego, habitantes de moradias incertas, com fome e sem documento, e que não têm qualquer guia para lhes mostrar o édito onde seus nomes estão impressos ao lado de ignorados artigos de lei e da ameaça de condenação”. Sem embargo da culta manifestação do ilustre Prof. Dotti, temos que admitir também que, ao lado dos ‘deserdados do testamento de Adão’ estão os ‘criminosos profissionais’, aqueles que fazem do crime o seu meio de vida, não por falta de oportunidade para sobreviver honestamente, mas por vocação. Assim sendo, data venia, embora com boa intenção, quando o legislador previu a suspensão do processo indefinidamente e a possibilidade, e não obrigatoriedade, da produção antecipada da prova, mesmo que se considere, em contrapartida, a não fluência do prazo prescricional, criou uma possibilidade de fuga à responsabilidade penal, pois é evidente que após poucos anos, comparecendo o réu ou sendo preso, e voltando a fluir o processo e o respectivo prazo prescricional, na maioria das vezes não haverá mais prova alguma capaz de propiciar a sua condenação. Desta forma, seria fácil, em termos práticos, que algum ‘criminoso profissional’ seja ‘orientado’ por seu defensor a ‘desaparecer’ por alguns anos, e após checado o sumiço da prova testemunhal, poderia retornar para responder ao processo que estava suspenso, o qual, voltando a fluir, lhe trará, certamente, um resultado satisfatório, com absolvição por ausência ou insuficiência de prova para a condenação. Logo, temos que concluir que o legislador, ao prever a ‘suspensão do processo’, ressaltando direitos individuais constitucionais, embora em contrapartida tenha previsto também a ‘suspensão do prazo prescricional’, não conseguiu, com esta, evitar a criação de “um canal de impunidade”, como dito acima, prejudicando o Direito do Estado e porque não dizer da coletividade, de ver o autor de uma infração penal devidamente punido, nos termos legalmente previstos. [1] Prescrição da Ação Penal – Suas Causas Suspensivas e Interruptivas; Edit. Saraiva; 1.998; pg.99/100. [2] Roberto L. F. de Almeida Jr. e Wallace P. Martins Jr.; Art. ‘Reflexões sobre a Lei 9.271/96’; Rev. APMP; pg. 34. [3] Instituições de Direito Penal; Vol. I; Tomo II; Edit. Max Limond; 3ª Edição; pg. 695. [4] Obra já citada; pg. 707. [5] Direito Penal; 1º vol.- Parte Geral; Edit. Saraiva; 21ª Edição; pg. 711. [6] Obra já citada; pg. 733. [7] Código de Processo Penal Anotado; Edit. Saraiva; 13ª edição; pg. 242; Coment. ao art. 366 do CPP. [8] Artigo “Lei 9.271/76: O Direito à Prescritibilidade, a Questão da Retroatividade e as Primeiras Tendências Jurisprudenciais”; Jurisprudência Catarinense; vol. 77; pg.96. [9] Processo Penal; Vol. 3; Edit. Saraiva; 20ª Edição; pg. 197/201. [10] Obra já citada; pg. 199/200. [11] Obra já citada; pg.242/243; Coment. ao art. 366 do CPP. [12] Obra já citada; pg.100/101. [13] Obra já citada; pg. 194. [14] Obra já citada; pg. 195. [15] A Lei nº 9.271/96 e o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo; RJTACrim, São Paulo; jan/mar 1998. [16] Art. ‘A Ausência do Acusado e a Suspensão do Processo’; RT 400/401-3. Submitted by eopen on ter, 17/07/2018 – 18:32 Por Leandro Salerno Leyser de AquinoOrientado pelo Prof. Danilo Augusto Ferreira I- Introdução. A lei 9.271, de 17 de Abril de 1.996, alterou os artigos 366, 367, 368 e 370 do Decreto-lei nº 3.689, de 03 de Outubro de 1.941 (Código de Processo Penal), e nos termos do seu artigo 2º, entrou em vigor sessenta dias após a sua publicação, ou seja, em 17 de junho de 1.996. Posteriormente, a lei 11.719, de 20 de Junho de 2.008, entre outras coisas, suprimiu os parágrafos 1º e 2º do art. 366, também do Código de Processo Penal. Dentre as alterações supra citadas, nos interessa o estudo daquelas referentes aos artigos 366 e 368 do referido diploma legal, especificamente no tocante à “suspensão do prazo prescricional”, uma vez que, nestes artigos foram criadas duas causas de suspensão da prescrição. II- Histórico da Suspensão do Prazo Prescricional. A suspensão da prescrição é um instituto que nasceu no Código Penal de 1.940, como ensina Eduardo Reale Ferrari[1], “nomeadamente no Brasil, a primeira codificação penal disciplinando as causas suspensivas da prescrição da ação surgiu com o advento do Código Penal de 1.940, que em seu artigo 116 enunciou duas causas suspensivas”. Essas duas causas citadas vieram previstas nos incisos I e II do artigo 116 do Código Penal, assim enunciadas: “Art. 116 – Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I- enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime; II- enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro;” Com o advento da reforma da parte geral do Código Penal, através da Lei nº 7.209, de 11/07/1.984, as duas causas suspensivas citadas foram mantidas e ainda foi criada mais uma, expressa em um parágrafo único, a saber: “Parágrafo único. Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo”. Estas causas de suspensão do processo no Código Penal não foram mais alteradas até os dias de hoje. No tocante às causas de suspensão da prescrição introduzidas pela Lei nº 9.271/96, elas derivam do preceito exposto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (ratificado pelo Decreto 678/92), que assegura a ‘citação pessoal como exigência do devido processo legal’[2]. Assim, atualmente, além das causas de suspensão da prescrição que serão estudadas neste trabalho, existem aquelas previstas no Código Penal, supra citadas, bem como nos artigos 89, parágrafo 6º, da Lei nº 9.099/95, e 53, parágrafo 2º, da Constituição Federal.   III- Prescrição – Suspensão – Conceitos.   Segundo Basileu Garcia[3], “a prescrição é a renúncia do Estado a punir a infração, em face do decurso de tempo”. Prosseguindo, o mesmo autor[4] esclarece, quanto à suspensão da prescrição, a saber: “caracteriza as causas suspensivas o aparecimento de um obstáculo à ação repressora, que, forçosamente, se detém. Mas a inatividade é justificada. Por isso, não há cogitar de prescrição durante o tempo em que perdura o impedimento. O tempo anterior a êsse hiato soma-se ao posterior, em benefício do réu, porque a inação, antes e depois do interregno, não tem justificativa”. Segundo Damásio E. de Jesus[5], “prescrição penal é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do tempo sem o seu exercício”. No tocante à suspensão do processo, ensina Damásio[6]:“Na suspensão da prescrição o tempo decorrido antes da causa é computado no prazo; na interrupção, o tempo decorrido antes da causa não é computado no prazo, que recomeça a correr por inteiro. Em outros termos: cessado o efeito da causa suspensiva, a prescrição recomeça a correr, computando-se o tempo decorrido antes dela; interrompida a prescrição, o prazo recomeça a correr por inteiro”.    IV- Da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal. Com o advento da Lei nº 9.271/96 o artigo 366 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redação: “Art. 366 – Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. §1º. As provas antecipadas serão produzidas na presença do Ministério Público e do defensor dativo (Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008). §2º. Comparecendo o acusado, ter-se-á por citado pessoalmente, prosseguindo o processo em seus ulteriores atos (Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008).”   Pois bem, estabeleceu a lei acima citada que, se o réu, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional. Portanto, a decisão de suspensão do prazo prescricional vem acompanhada da de suspensão do processo, devendo, logicamente, esta preceder aquela, embora ambas tomadas no mesmo momento processual. É importante consignar, a título de informação, uma exceção já existente, no sentido da não aplicabilidade expressa do artigo 366 do Código de Processo Penal, prevista na Lei nº 9.613/98, que dispõe sobre os crimes de ‘lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores’.    V- Requisitos para a Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal. Pela leitura no novo texto legal referido, podemos concluir que, para a suspensão do processo e do “prazo prescricional” são necessários os seguintes requisitos:   a-   Que o réu seja citado por edital; b-   Que o réu, embora citado por edital, não compareça em Juízo; c-   Que o réu, embora citado por edital e não comparecendo em Juízo, não constitua advogado.   O primeiro requisito é que o réu tenha sido citado fictamente, ou de forma presumida. No processo penal, a única forma de citação ficta é a citatio edictalis, ou seja, a citação por edital. É ficta ou presumida a citação porque, não tendo sido feita na própria pessoa do réu, presume-se, por meio da respectiva publicação na imprensa oficial ou afixação do edital no átrio do Fórum, que ele tenha tomado conhecimento da acusação que lhe está sendo imputada em Juízo e do respectivo chamamento para interrogatório. O segundo consiste em, embora citado fictamente, não compareça o réu em Juízo, para ser interrogado, ou seja, em se tornar revel, ignorando o chamamento a Juízo. O último requisito é que, citado fictamente e revel, não constitua o réu advogado. Tais requisitos são extraídos da própria lei e são cumulativos, e não alternativos, vale dizer, deverão estar presentes concomitantemente para que o magistrado, a requerimento das partes ou de ofício, determine expressamente, uma vez que não decorre automaticamente da lei, após decretar a revelia do réu, a suspensão do andamento processual e do respectivo prazo prescricional. Quanto aos requisitos citados, não há divergência na doutrina. Entretanto, existem inúmeras discussões doutrinárias quanto ao “prazo em que a prescrição pode ficar suspensa” e quanto à “retroatividade ou não do referido artigo de lei”.   VI- Período de Incidência da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, atendidos aos requisitos supra,  como já dito, junto com a suspensão do processo deve vir a suspensão do prazo prescricional. Contudo, o legislador falhou ao “não prever qual o período em que a suspensão do prazo prescricional poderia incidir”, e por isso, uma interpretação literal da lei, poderia acarretar, em tese, a uma hipótese de crime imprescritível, ao se concluir que o “prazo prescricional” ficaria suspenso “até o comparecimento do réu em Juízo”, em outras palavras, se o réu nunca comparecesse em Juízo, nunca o respectivo crime prescreveria. Ocorre que a Constituição Federal previu expressamente quais as duas ‘únicas’ hipóteses de crimes imprescritíveis, a saber: crime de “racismo” (artigo 5º, inciso XLII) e de “grupos armados contra o Estado de Direito” (artigo 5º, inciso XLIV), e não autorizou ao legislador infra-constitucional a criação de nenhuma outra. Logo, fica claro que a interpretação que cria a hipótese de crime imprescritível é inconstitucional, daí termos que admitir que a melhor interpretação ao texto legal referido é a de que há limite temporal para a incidência da “suspensão do prazo prescricional”. Esse limite temporal me parece coerente como sendo aquele defendido por Damásio E. de Jesus[7], no sentido de que “o limite da suspensão do curso prescricional corresponde aos prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena privativa de liberdade imposta abstratamente”. Prossegue o autor afirmando que “se cominada abstratamente somente pena de multa, como em algumas contravenções, considera-se o prazo de dois anos (CP, art. 114, I)”. Sobre o assunto ensina o mestre Luiz Flávio Gomes[8], a saber: “A única interpretação (e aplicação) constitucionalmente válida que se pode adotar em relação à Lei nº 9.271/96, na questão relacionada com a suspensão do prazo prescricional, consiste em reconhecer, no ato da suspensão do processo, que aquela (suspensão da prescrição) vige por tempo determinado, por tempo certo e limitado, que deve corresponder, no nosso modo de entender, a ‘um período prescricional’ (pena máxima em abstrato combinada com o art. 109 do CP). Dito de outra maneira: durante um ‘período prescricional’ (computado pela pena em abstrato combinada com o art. 109 do CP) não corre a prescrição. Mas, terminado esse período, o prazo prescricional que estava em andamento retoma o seu curso (note-se: retoma o curso, pois estamos diante de causa ‘suspensiva’, não interruptiva; logo, o tempo que transcorreu antes da suspensão do processo não desaparece, é válido e deve ser computado).  Assim interpretada a Lei nº 9.271/96, assegura-se a intangibilidade do ‘direito à prescritibilidade’, que possui, aliás, como visto, cunho constitucional”. Posição um pouco diversa das acima citadas é a de Fernando da Costa Tourinho Filho[9], que entende que: “Sem embargo de entendimento contrário (RT, 733/600), essa suspensão do curso da prescrição por prazo indeterminado, melhor refletindo, não implica ‘imprescritibilidade de conduta’, ao contrário daquelas hipóteses tratadas na Lei Maior. Os crimes a que se refere a Constituição Federal, naqueles incisos do art. 5º, sim, são imprescritíveis. Já as infrações praticadas por aqueles citados por edital que não acudirem à ‘in jus vocatio’ nem constituírem Advogado, não. Não e renão. É o prazo prescricional que fica suspenso se, citado por edital, não atender ao chamado. É diferente das hipóteses cuidadas na Lei das Leis. Ali é o crime que é imprescritível: antes, durante ou após a instauração do processo. Aqui, no CPP, a prescrição fica suspensa se, citado por edital, não comparecer nem constituir defensor. A diferença é bem grande. … A hipótese tratada no art. 366 não é símile daquelas previstas no texto da Lei Maior. Se o réu, a teor do art. 366, foi citado por edital, não atendeu ao chamado, mas constituiu Advogado; se foi citado pessoalmente, e não atendeu ao chamado; se atendeu e depois deixou o processo à revelia, em todas essas hipóteses não há cuidar-se de imprescritibilidade. Se, em qualquer desses casos, vier a ser condenado, e não for encontrado para o cumprimento da pena, a prescrição será regulada pela pena imposta. Logo, não se pode estabelecer, ‘data venia’, comparação entre a imprescritibilidade a que se refere o art. 366 do CPP com a tratada no corpo da Lei Básica”. Entretanto, este último autor, embora entenda que o art. 366 não criou uma ‘imprescritibilidade de conduta’, admitiu que o legislador foi ‘por demais severo’, propondo que o mesmo deveria ter previsto que[10]: “O processo ficaria suspenso, com a produção antecipada das provas de natureza urgente, notadamente a testemunhal e a pericial, ‘como dever do Juiz’ (e não como mera faculdade, …), suspender-se-ia, também, o curso da prescrição até o limite máximo fixado para a espécie pelo art. 109 do CP. Findo o prazo, considerada a pena em abstrato, a prescrição voltaria a fluir, observadas as regras dos arts. 109, 110 e 117 do CP. Ou que se fixasse em dobro o prazo prescricional para essas hipóteses, da mesma forma que se fixou pela metade o lapso prescricional para os menores de 21 e maiores de 70 anos. Outra solução: a prescrição fluiria normalmente, mas o revel não faria jus à prescrição retroativa”. Ainda que se admita que realmente a Lei nº 9.271/96, ao alterar o artigo 366 do Código de Processo Penal, não “criou crimes imprescritíveis”, até porque não criou ‘tipos penais’, não se pode negar também que acabou por  “criar situações jurídicas que podem levar qualquer delito à imprescritibilidade”, desde que o acusado, citado por edital, nunca compareça em Juízo e nunca constitua advogado, hipótese em que o delito que lhe foi imputado nunca prescreverá. Em que pese Fernando da Costa Tourinho Filho ter defendido a tese de ‘não criação de imprescritibilidade’, por parte da alteração introduzida no artigo 366 do Código de Processo Penal, pela lei citada, a verdade é que, dentre as hipóteses que sugeriu, como solução, está aquela adotada pelos autores Damásio E. de Jesus e Luiz Flávio Gomes, no sentido de que a suspensão do prazo prescricional seja limitada, nos termos do artigo 109 do Código Penal, considerando a pena máxima em abstrato para o delito. Assim, em harmonia com uma das sugestões do autor Tourinho Filho e com os entendimentos dos autores Damásio de Jesus e Luiz Flávio Gomes, entendo que a melhor solução a ser adotada ao caso é a de se considerar como ‘limitado’ o período de incidência da suspensão do prazo prescricional, limitação esta que deverá ter por base a pena máxima prevista em abstrato para o delito e os prazos estabelecido no artigo 109 do Código Penal. Portanto, determinado pelo magistrado a suspensão do andamento do processo e do respectivo prazo prescricional, há que ser estabelecido, já na decisão citada, que essa “suspensão da prescrição” perdurará pelo limite supra citado.   VII- Retroatividade ou não da Lei nº 9.271/96, em face das alterações efetuadas no artigo 366 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, a lei supra criou, no artigo 366 do Código de Processo Penal, dois institutos novos, o da “suspensão do processo” e o da “suspensão do prazo prescricional”. O primeiro é de índole processual e o segundo de índole penal, daí as divergências, quanto ao momento de suas aplicações, isto porque, o instituto de direito processual penal tem aplicação imediata, nos termos do artigo 2º do Código de Processo Penal, o que significa dizer que, pode ser aplicado imediatamente aos processos em andamento, mesmo referente a fatos praticados anteriormente à  vigência da lei que o contém. Já o instituto de direito penal só pode ter aplicação imediata, aos processos em andamento, nas hipóteses em que não prejudicar o réu, nos termos do preceito constitucional previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, vale dizer, só pode alcançar fatos praticados antes da vigência da lei que o contém quando for para beneficiar o réu. Diante disso, criou-se pelo menos três correntes diferentes, referentes à aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, a saber:    a-   Da irretroatividade total; b-   Da retroatividade total; c-   Da retroatividade parcial;   Quanto à primeira corrente, defendem-na, dentre outros, o Prof. Damásio E. de Jesus[11], nos seguintes termos: “A norma do art. 366, ‘caput’, do CPP, na parte em que determina a suspensão do processo, tem natureza processual penal, uma vez que disciplina o ‘desenvolvimento do processo’. Quando, entretanto, prevê a suspensão do prazo prescricional, é de direito penal material. Temos, então, uma disposição mista, impondo princípios de direito substantivo e processual. Quando isso ocorre, prevalece a natureza penal. E assim convém, uma vez que a suspensão do processo gera, fatalmente, o impedimento do decurso prescricional. O juiz, nos termos da nova legislação, sobrestando o processo, provoca automaticamente a suspensão do lapso prescricional, proibindo que o feito se dirija à extinção da punibilidade. Não se pode, pois, dissociar as duas formas de suspensão, a do processo e da prescrição, para se conferir à lei incidência imediata no que tange ao sobrestamento da ação penal (CPP, art. 2º) e efeito irretroativo na parte em que impõe a suspensão da prescrição (CP, art. 2º, parágrafo único). A suspensão do prazo prescricional em face do sobrestamento da ação penal era desconhecida em nossa legislação. Logo, o art. 366, nesse ponto, é mais gravoso que o ordenamento legal anterior (novatio legis in pejus). Deve ser, por isso, irretroativo, não se aplicando às infrações penais cometidas antes da vigência da lei (CF, art. 5º, XL; CP, art. 2º, parágrafo único). Com relação à segunda corrente, defendem-na, dentre outros, Luiz Flávio Gomes[12], a saber: “Admitindo-se algum ‘limite’ (quanto ao prazo da suspensão prescricional), já não se pode dizer que a nova lei tenha criado uma ‘situação de imprescritibilidade’ (eterna). … Assim enfocada a nova lei, não parece desarrazoada a tese da sua retroatividade total (parte processual e parte penal), mesmo porque caberia considerar o seguinte: em todas as hipóteses legais de suspensão do prazo prescricional ( … ) dá-se o advento de uma situação nova ‘posterior’ ao delito. A causa suspensiva do prazo prescricional ( … ) sempre surge depois do delito. A suspensão do prazo, nessas hipóteses, significa indiscutivelmente um certo prejuízo para o acusado, mas é uma imposição (proporcional) para se estabelecer um ‘equilíbrio de armas’. Se o Estado, pelas razões supra-indicadas, não pode exercitar temporariamente a persecução penal (não pode, em outras palavras, ‘fazer andar o processo’), tampouco parece justo que seja ‘punido’ com o transcurso do tempo. Assim considerada a questão, não tem relevância que a causa suspensiva tenha por base uma lei precedente ou venha inserida no contexto de uma lei nova. … No fundo, o que temos em conflito são dois direitos fundamentais do acusado: de um lado o direito de autodefesa, como expressão do devido processo legal, contraditório, ampla defesa etc.; de outro, o direito de não ser prejudicado por uma lei ‘penal’ nova. Urge a ponderação desses valores. … A teoria da proporcionalidade, que entra em cena sempre que vários direitos fundamentais estão em conflito, é extremamente útil para dar-nos uma luz ao complexo problema em questão. Concluindo, se ‘limitado’ o prazo de suspensão da prescrição (prazo certo, determinado), pode ser sustentável a tese da retroatividade total da lei (tanto na sua parte processual, como penal)”. No tocante à terceira corrente, defendem-na, dentre outros, Fernando da Costa Tourinho Filho[13], da seguinte forma: “O diploma legal em exame, ao determinar a ‘suspensão do processo’, deve ter tido incidência imediata, isto é, a partir de 17-6-1996, quando se expirou a ‘vacatio legis’, nos termos do artigo 2º do CPP, porquanto se trata de norma processual penal. … Mas, ao estabelecer a ‘suspensão do curso da prescrição’, a matéria é indiscutivelmente de natureza penal, subordinando-se às regras da temporalidade das normas penais. … E, considerando que o art. 5º, XL, da Lei Maior prescreve que ‘a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu’, parece claro que o diploma em análise, no seu aspecto penal, somente poderá ser aplicado às infrações que se verificaram a partir do dia 17 de junho de 1996, data em que começou a vigorar a Lei nº 9.271, de 17-4-1996”. Prossegue o mesmo autor[14] esclarecendo que: “Se se tratasse de um ‘instituto’ de aspecto duplo (penal e processual penal), tal como ocorre com a ‘representação’ e a ‘queixa’, que apresentam prevalentes caracteres penais, pela sua natural conexão com o direito penal material, aplicar-se-lhe-ia o princípio da irretroatividade. Na hipótese, não se trata de um instituto, mas de uma norma que cuida, num só contexto, de duas coisas distintas, apresentando, assim, uma natureza dúplice: penal e processual. Em face dessa duplicidade, não se pode, a nosso juízo, dar prevalência a uma ou a outra natureza. Assim, aos processos em curso, se houve citação-edital e o réu não constituiu Advogado, cumpre ao Juiz suspender apenas o curso do procedimento. … Insista-se: a suspensão do lapso prescricional somente será possível quando se tratar de infração cometida do dia 17 de junho de 1996 para a frente”. Dentre as correntes doutrinárias apresentadas, entendo que a mais convincente é que prevê a ‘irretroatividade total’ do artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, isto porque, julgo imbatível o argumento de que, trazendo a lei a ‘suspensão do prazo prescricional’, que não existia anteriormente no citado artigo, se trata de uma novatio legis in pejus, e como tal, não pode retroagir para atingir fatos praticados antes de sua vigência, sob pena de ferir o preceito constitucional do artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e a previsão legal do artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal. Quanto à corrente da ‘retroatividade total’ fica claro que a mesma esbarra nos preceitos constitucional e legal supra citados, que impedem a retroação da lei para prejudicar o réu, razão pela qual deve ser afastada. Com referência à corrente da ‘retroatividade parcial’, entendo também deva a mesma ser afastada, uma vez que não vejo justificativa legal para que se possa ‘cindir’ uma lei e aplicá-la apenas em parte, vale dizer, o magistrado iria aplicar parte de uma lei e, obviamente, parte de outra, o que implicaria, na prática, em criar uma nova lei, com partes extraídas das outras duas. Tal conduta, com certeza, fere o princípio constitucional da Independência dos Poderes, previsto no artigo 2º da Constituição Federal, uma vez que não compete ao Poder Judiciário elaborar (criar) leis. Portanto, o artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, só deve ser aplicado a fatos praticados já na vigência desta.   VIII- Da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal. Com o advento da Lei nº 9.271/96 o artigo 368 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redação: “Art. 368 – Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento.” Pois bem, estabeleceu a lei acima citada que, se o réu estiver no estrangeiro, em lugar conhecido, será citado por rogatória, independentemente do delito ser afiançável ou não (antes da Lei nº 9.271/96 a citação por rogatória era apenas na hipótese de crime inafiançável), ficando suspenso o prazo prescricional até o cumprimento da carta.   IX- Requisitos para a Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal. Pela leitura no novo texto legal referido, podemos concluir que, para a suspensão do “prazo prescricional” são necessários os seguintes requisitos:   a-  Que o réu esteja no estrangeiro; b-  Que o réu, no estrangeiro, esteja em lugar conhecido;   O primeiro requisito é que o réu esteja no estrangeiro, vale dizer, fora do nosso país. O outro requisito é que, embora no estrangeiro, seja conhecido o local onde se encontra, ou seja, seja conhecido o seu endereço, pois a citação, ainda que por rogatória, não vai deixar de ser “pessoal”. Tais requisitos são extraídos da própria lei e são cumulativos, e não alternativos, vale dizer, deverão estar presentes concomitantemente para que o magistrado determine a expedição de carta rogatória para citação do acusado e, consequentemente, fique suspenso o prazo prescricional. Quanto aos requisitos citados, não há divergência na doutrina. Entretanto, existem aqui também inúmeras discussões doutrinárias quanto ao “prazo em que a prescrição pode ficar suspensa”, embora tenha sido previsto, de forma insatisfatória, ‘até o seu cumprimento (da carta rogatória)’, e quanto à “retroatividade ou não do artigo de lei referido”.   X- Período de Incidência da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, atendidos aos requisitos supra,  como já dito, deverá ser suspenso o prazo prescricional.  Contudo, o legislador falhou mais uma vez ao “não prever, de forma clara, qual o período em que a suspensão do prazo prescricional poderia incidir”, uma vez que, embora tenha estabelecido um termo para a suspensão da prescrição, “até o cumprimento da carta rogatória”, este foi muito vago, podendo significar, mais uma vez, atendendo a uma interpretação literal da lei, em tese, a hipótese de crime imprescritível, pois se a rogatória referida nunca retornar, nunca o respectivo crime prescreverá. Assim, reitera-se aqui tudo o que foi dito no “item VI”, quanto ao limite do período de incidência da suspensão do prazo prescricional, bem como que este limite deve estar previsto na decisão que determinar a citada suspensão.   XI- Retroatividade ou não da Lei nº 9.271/96, em face das alterações efetuadas no artigo 368 do Código de Processo Penal – Conclusão.   A lei supra criou, no artigo 368 do Código de Processo Penal, um instituto novo, referente à “suspensão do prazo prescricional”. Tal instituto é de direito penal substantivo e, como tal, só pode ter aplicação imediata, aos processos em andamento, na hipótese em que não prejudicar o réu, nos termos do preceito constitucional previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e do artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, vale dizer, só pode alcançar fatos praticados antes da vigência da lei que o contém quando for para beneficiar o réu. Contudo, a ‘suspensão do prazo prescricional’, prevista no artigo supra, é, sem dúvida, algo novo que veio em prejuízo do réu, portanto, se trata de uma novatio legis in pejus, e, assim sendo, não poderá retroagir para alcançar fatos praticados antes de sua vigência. Logo, o artigo 368 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, só deve ser aplicado a fatos praticados já na vigência desta.   XII- Jurisprudência – Conclusão.   No tocante à jurisprudência é oportuno citarmos a conclusão extraída do artigo escrito pelo eminente magistrado José Renato Nalini[15], que fez um apanhado sobre a tendência do TACrim/SP, referente às inovações da Lei nº 9.271/96, citando inúmeros julgados, a saber: “Até o momento, delineia-se, no maior e mais especializado Tribunal do Brasil, uma tendência a se considerá-la: a)‘constitucional’, ou seja, compatível com a ordem fundante; b) de ‘aplicação irretroativa’ para os crimes praticados antes de sua vigência, diante da natureza mista de norma a um tempo material e processual; c) ‘insuscetível de cisão’, ou seja, inviável a aplicação da parte considerada benéfica e a inaplicação da parte prejudicial ao réu; d) a ‘prisão preventiva não é conseqüência necessária do decreto de revelia’; e) a ‘produção antecipada de prova está confiada ao prudente arbítrio do Juiz em cada caso concreto’ e f) o recurso cabível da decisão que suspende o processo é o ‘recurso em sentido estrito’.  Outras questões ainda estão a suscitar dúvidas. O ‘prazo prescricional’ a ser observado, a partir de integral vigência da Lei, não encontra unanimidade na doutrina e jurisprudência. Dentre as opções possíveis, parece razoável a orientação que remete ao ‘caput’ do art. 109 do CP. O máximo da pena privativa de liberdade prevista para o crime é que passaria a ser considerado no cálculo desse lapso”. Portanto, dentro do tema do nosso trabalho, podemos observar que a jurisprudência tem se voltado no sentido das conclusões já explanadas em cada item acima, especificamente no sentido da “irretroatividade da lei” e, consequentemente, de sua não cisão, bem como de se estabelecer um “limite ao prazo da suspensão do processo”, que pode ser o previsto no artigo 109 do Código Penal, considerando a pena máxima prevista em abstrato para o delito.   XIII- Conclusão final. O legislador teve boa intenção, com a Lei nº 9.271/96, ao estatuir que o processo não poderia prosseguir sem a presença do acusado ou seu defensor constituído, suspendendo a prescrição, presumindo o desconhecimento daquele sobre os fatos que lhe estão sendo imputados, dando ênfase, dentre outros, aos princípios constitucionais da ‘ampla defesa’, ‘devido processo legal’ e ‘contraditório’. No dizer de René Ariel Dotti[16] “o grande desafio proposto pelo novo diploma consiste no empenho de resgatar a participação da imensa legião de pessoas que vive à margem do processo. Ela é composta pelos réus desaparecidos. Geralmente são os deserdados do testamento de Adão, nômades à procura de emprego, habitantes de moradias incertas, com fome e sem documento, e que não têm qualquer guia para lhes mostrar o édito onde seus nomes estão impressos ao lado de ignorados artigos de lei e da ameaça de condenação”. Sem embargo da culta manifestação do ilustre Prof. Dotti, temos que admitir também que, ao lado dos ‘deserdados do testamento de Adão’ estão os ‘criminosos profissionais’, aqueles que fazem do crime o seu meio de vida, não por falta de oportunidade para sobreviver honestamente, mas por vocação. Assim sendo, data venia, embora com boa intenção, quando o legislador previu a suspensão do processo indefinidamente e a possibilidade, e não obrigatoriedade, da produção antecipada da prova, mesmo que se considere, em contrapartida, a não fluência do prazo prescricional, criou uma possibilidade de fuga à responsabilidade penal, pois é evidente que após poucos anos, comparecendo o réu ou sendo preso, e voltando a fluir o processo e o respectivo prazo prescricional, na maioria das vezes não haverá mais prova alguma capaz de propiciar a sua condenação. Desta forma, seria fácil, em termos práticos, que algum ‘criminoso profissional’ seja ‘orientado’ por seu defensor a ‘desaparecer’ por alguns anos, e após checado o sumiço da prova testemunhal, poderia retornar para responder ao processo que estava suspenso, o qual, voltando a fluir, lhe trará, certamente, um resultado satisfatório, com absolvição por ausência ou insuficiência de prova para a condenação. Logo, temos que concluir que o legislador, ao prever a ‘suspensão do processo’, ressaltando direitos individuais constitucionais, embora em contrapartida tenha previsto também a ‘suspensão do prazo prescricional’, não conseguiu, com esta, evitar a criação de “um canal de impunidade”, como dito acima, prejudicando o Direito do Estado e porque não dizer da coletividade, de ver o autor de uma infração penal devidamente punido, nos termos legalmente previstos. [1] Prescrição da Ação Penal – Suas Causas Suspensivas e Interruptivas; Edit. Saraiva; 1.998; pg.99/100. [2] Roberto L. F. de Almeida Jr. e Wallace P. Martins Jr.; Art. ‘Reflexões sobre a Lei 9.271/96’; Rev. APMP; pg. 34. [3] Instituições de Direito Penal; Vol. I; Tomo II; Edit. Max Limond; 3ª Edição; pg. 695. [4] Obra já citada; pg. 707. [5] Direito Penal; 1º vol.- Parte Geral; Edit. Saraiva; 21ª Edição; pg. 711. [6] Obra já citada; pg. 733. [7] Código de Processo Penal Anotado; Edit. Saraiva; 13ª edição; pg. 242; Coment. ao art. 366 do CPP. [8] Artigo “Lei 9.271/76: O Direito à Prescritibilidade, a Questão da Retroatividade e as Primeiras Tendências Jurisprudenciais”; Jurisprudência Catarinense; vol. 77; pg.96. [9] Processo Penal; Vol. 3; Edit. Saraiva; 20ª Edição; pg. 197/201. [10] Obra já citada; pg. 199/200. [11] Obra já citada; pg.242/243; Coment. ao art. 366 do CPP. [12] Obra já citada; pg.100/101. [13] Obra já citada; pg. 194. [14] Obra já citada; pg. 195. [15] A Lei nº 9.271/96 e o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo; RJTACrim, São Paulo; jan/mar 1998. [16] Art. ‘A Ausência do Acusado e a Suspensão do Processo’; RT 400/401-3. Por Leandro Salerno Leyser de AquinoOrientado pelo Prof. Danilo Augusto Ferreira I- Introdução. A lei 9.271, de 17 de Abril de 1.996, alterou os artigos 366, 367, 368 e 370 do Decreto-lei nº 3.689, de 03 de Outubro de 1.941 (Código de Processo Penal), e nos termos do seu artigo 2º, entrou em vigor sessenta dias após a sua publicação, ou seja, em 17 de junho de 1.996. Posteriormente, a lei 11.719, de 20 de Junho de 2.008, entre outras coisas, suprimiu os parágrafos 1º e 2º do art. 366, também do Código de Processo Penal. Dentre as alterações supra citadas, nos interessa o estudo daquelas referentes aos artigos 366 e 368 do referido diploma legal, especificamente no tocante à “suspensão do prazo prescricional”, uma vez que, nestes artigos foram criadas duas causas de suspensão da prescrição. II- Histórico da Suspensão do Prazo Prescricional. A suspensão da prescrição é um instituto que nasceu no Código Penal de 1.940, como ensina Eduardo Reale Ferrari[1], “nomeadamente no Brasil, a primeira codificação penal disciplinando as causas suspensivas da prescrição da ação surgiu com o advento do Código Penal de 1.940, que em seu artigo 116 enunciou duas causas suspensivas”. Essas duas causas citadas vieram previstas nos incisos I e II do artigo 116 do Código Penal, assim enunciadas: “Art. 116 – Antes de passar em julgado a sentença final, a prescrição não corre: I- enquanto não resolvida, em outro processo, questão de que dependa o reconhecimento da existência do crime; II- enquanto o agente cumpre pena no estrangeiro;” Com o advento da reforma da parte geral do Código Penal, através da Lei nº 7.209, de 11/07/1.984, as duas causas suspensivas citadas foram mantidas e ainda foi criada mais uma, expressa em um parágrafo único, a saber: “Parágrafo único. Depois de passada em julgado a sentença condenatória, a prescrição não corre durante o tempo em que o condenado está preso por outro motivo”. Estas causas de suspensão do processo no Código Penal não foram mais alteradas até os dias de hoje. No tocante às causas de suspensão da prescrição introduzidas pela Lei nº 9.271/96, elas derivam do preceito exposto na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (ratificado pelo Decreto 678/92), que assegura a ‘citação pessoal como exigência do devido processo legal’[2]. Assim, atualmente, além das causas de suspensão da prescrição que serão estudadas neste trabalho, existem aquelas previstas no Código Penal, supra citadas, bem como nos artigos 89, parágrafo 6º, da Lei nº 9.099/95, e 53, parágrafo 2º, da Constituição Federal.   III- Prescrição – Suspensão – Conceitos.   Segundo Basileu Garcia[3], “a prescrição é a renúncia do Estado a punir a infração, em face do decurso de tempo”. Prosseguindo, o mesmo autor[4] esclarece, quanto à suspensão da prescrição, a saber: “caracteriza as causas suspensivas o aparecimento de um obstáculo à ação repressora, que, forçosamente, se detém. Mas a inatividade é justificada. Por isso, não há cogitar de prescrição durante o tempo em que perdura o impedimento. O tempo anterior a êsse hiato soma-se ao posterior, em benefício do réu, porque a inação, antes e depois do interregno, não tem justificativa”. Segundo Damásio E. de Jesus[5], “prescrição penal é a perda da pretensão punitiva ou executória do Estado pelo decurso do tempo sem o seu exercício”. No tocante à suspensão do processo, ensina Damásio[6]:“Na suspensão da prescrição o tempo decorrido antes da causa é computado no prazo; na interrupção, o tempo decorrido antes da causa não é computado no prazo, que recomeça a correr por inteiro. Em outros termos: cessado o efeito da causa suspensiva, a prescrição recomeça a correr, computando-se o tempo decorrido antes dela; interrompida a prescrição, o prazo recomeça a correr por inteiro”.    IV- Da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal. Com o advento da Lei nº 9.271/96 o artigo 366 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redação: “Art. 366 – Se o acusado, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional, podendo o juiz determinar a produção antecipada das provas consideradas urgentes e, se for o caso, decretar prisão preventiva, nos termos do disposto no art. 312. §1º. As provas antecipadas serão produzidas na presença do Ministério Público e do defensor dativo (Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008). §2º. Comparecendo o acusado, ter-se-á por citado pessoalmente, prosseguindo o processo em seus ulteriores atos (Revogado pela Lei nº 11.719, de 2008).”   Pois bem, estabeleceu a lei acima citada que, se o réu, citado por edital, não comparecer, nem constituir advogado, ficarão suspensos o processo e o curso do prazo prescricional. Portanto, a decisão de suspensão do prazo prescricional vem acompanhada da de suspensão do processo, devendo, logicamente, esta preceder aquela, embora ambas tomadas no mesmo momento processual. É importante consignar, a título de informação, uma exceção já existente, no sentido da não aplicabilidade expressa do artigo 366 do Código de Processo Penal, prevista na Lei nº 9.613/98, que dispõe sobre os crimes de ‘lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores’.    V- Requisitos para a Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal. Pela leitura no novo texto legal referido, podemos concluir que, para a suspensão do processo e do “prazo prescricional” são necessários os seguintes requisitos:   a-   Que o réu seja citado por edital; b-   Que o réu, embora citado por edital, não compareça em Juízo; c-   Que o réu, embora citado por edital e não comparecendo em Juízo, não constitua advogado.   O primeiro requisito é que o réu tenha sido citado fictamente, ou de forma presumida. No processo penal, a única forma de citação ficta é a citatio edictalis, ou seja, a citação por edital. É ficta ou presumida a citação porque, não tendo sido feita na própria pessoa do réu, presume-se, por meio da respectiva publicação na imprensa oficial ou afixação do edital no átrio do Fórum, que ele tenha tomado conhecimento da acusação que lhe está sendo imputada em Juízo e do respectivo chamamento para interrogatório. O segundo consiste em, embora citado fictamente, não compareça o réu em Juízo, para ser interrogado, ou seja, em se tornar revel, ignorando o chamamento a Juízo. O último requisito é que, citado fictamente e revel, não constitua o réu advogado. Tais requisitos são extraídos da própria lei e são cumulativos, e não alternativos, vale dizer, deverão estar presentes concomitantemente para que o magistrado, a requerimento das partes ou de ofício, determine expressamente, uma vez que não decorre automaticamente da lei, após decretar a revelia do réu, a suspensão do andamento processual e do respectivo prazo prescricional. Quanto aos requisitos citados, não há divergência na doutrina. Entretanto, existem inúmeras discussões doutrinárias quanto ao “prazo em que a prescrição pode ficar suspensa” e quanto à “retroatividade ou não do referido artigo de lei”.   VI- Período de Incidência da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 366 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, atendidos aos requisitos supra,  como já dito, junto com a suspensão do processo deve vir a suspensão do prazo prescricional. Contudo, o legislador falhou ao “não prever qual o período em que a suspensão do prazo prescricional poderia incidir”, e por isso, uma interpretação literal da lei, poderia acarretar, em tese, a uma hipótese de crime imprescritível, ao se concluir que o “prazo prescricional” ficaria suspenso “até o comparecimento do réu em Juízo”, em outras palavras, se o réu nunca comparecesse em Juízo, nunca o respectivo crime prescreveria. Ocorre que a Constituição Federal previu expressamente quais as duas ‘únicas’ hipóteses de crimes imprescritíveis, a saber: crime de “racismo” (artigo 5º, inciso XLII) e de “grupos armados contra o Estado de Direito” (artigo 5º, inciso XLIV), e não autorizou ao legislador infra-constitucional a criação de nenhuma outra. Logo, fica claro que a interpretação que cria a hipótese de crime imprescritível é inconstitucional, daí termos que admitir que a melhor interpretação ao texto legal referido é a de que há limite temporal para a incidência da “suspensão do prazo prescricional”. Esse limite temporal me parece coerente como sendo aquele defendido por Damásio E. de Jesus[7], no sentido de que “o limite da suspensão do curso prescricional corresponde aos prazos do art. 109 do CP, considerando-se o máximo da pena privativa de liberdade imposta abstratamente”. Prossegue o autor afirmando que “se cominada abstratamente somente pena de multa, como em algumas contravenções, considera-se o prazo de dois anos (CP, art. 114, I)”. Sobre o assunto ensina o mestre Luiz Flávio Gomes[8], a saber: “A única interpretação (e aplicação) constitucionalmente válida que se pode adotar em relação à Lei nº 9.271/96, na questão relacionada com a suspensão do prazo prescricional, consiste em reconhecer, no ato da suspensão do processo, que aquela (suspensão da prescrição) vige por tempo determinado, por tempo certo e limitado, que deve corresponder, no nosso modo de entender, a ‘um período prescricional’ (pena máxima em abstrato combinada com o art. 109 do CP). Dito de outra maneira: durante um ‘período prescricional’ (computado pela pena em abstrato combinada com o art. 109 do CP) não corre a prescrição. Mas, terminado esse período, o prazo prescricional que estava em andamento retoma o seu curso (note-se: retoma o curso, pois estamos diante de causa ‘suspensiva’, não interruptiva; logo, o tempo que transcorreu antes da suspensão do processo não desaparece, é válido e deve ser computado).  Assim interpretada a Lei nº 9.271/96, assegura-se a intangibilidade do ‘direito à prescritibilidade’, que possui, aliás, como visto, cunho constitucional”. Posição um pouco diversa das acima citadas é a de Fernando da Costa Tourinho Filho[9], que entende que: “Sem embargo de entendimento contrário (RT, 733/600), essa suspensão do curso da prescrição por prazo indeterminado, melhor refletindo, não implica ‘imprescritibilidade de conduta’, ao contrário daquelas hipóteses tratadas na Lei Maior. Os crimes a que se refere a Constituição Federal, naqueles incisos do art. 5º, sim, são imprescritíveis. Já as infrações praticadas por aqueles citados por edital que não acudirem à ‘in jus vocatio’ nem constituírem Advogado, não. Não e renão. É o prazo prescricional que fica suspenso se, citado por edital, não atender ao chamado. É diferente das hipóteses cuidadas na Lei das Leis. Ali é o crime que é imprescritível: antes, durante ou após a instauração do processo. Aqui, no CPP, a prescrição fica suspensa se, citado por edital, não comparecer nem constituir defensor. A diferença é bem grande. … A hipótese tratada no art. 366 não é símile daquelas previstas no texto da Lei Maior. Se o réu, a teor do art. 366, foi citado por edital, não atendeu ao chamado, mas constituiu Advogado; se foi citado pessoalmente, e não atendeu ao chamado; se atendeu e depois deixou o processo à revelia, em todas essas hipóteses não há cuidar-se de imprescritibilidade. Se, em qualquer desses casos, vier a ser condenado, e não for encontrado para o cumprimento da pena, a prescrição será regulada pela pena imposta. Logo, não se pode estabelecer, ‘data venia’, comparação entre a imprescritibilidade a que se refere o art. 366 do CPP com a tratada no corpo da Lei Básica”. Entretanto, este último autor, embora entenda que o art. 366 não criou uma ‘imprescritibilidade de conduta’, admitiu que o legislador foi ‘por demais severo’, propondo que o mesmo deveria ter previsto que[10]: “O processo ficaria suspenso, com a produção antecipada das provas de natureza urgente, notadamente a testemunhal e a pericial, ‘como dever do Juiz’ (e não como mera faculdade, …), suspender-se-ia, também, o curso da prescrição até o limite máximo fixado para a espécie pelo art. 109 do CP. Findo o prazo, considerada a pena em abstrato, a prescrição voltaria a fluir, observadas as regras dos arts. 109, 110 e 117 do CP. Ou que se fixasse em dobro o prazo prescricional para essas hipóteses, da mesma forma que se fixou pela metade o lapso prescricional para os menores de 21 e maiores de 70 anos. Outra solução: a prescrição fluiria normalmente, mas o revel não faria jus à prescrição retroativa”. Ainda que se admita que realmente a Lei nº 9.271/96, ao alterar o artigo 366 do Código de Processo Penal, não “criou crimes imprescritíveis”, até porque não criou ‘tipos penais’, não se pode negar também que acabou por  “criar situações jurídicas que podem levar qualquer delito à imprescritibilidade”, desde que o acusado, citado por edital, nunca compareça em Juízo e nunca constitua advogado, hipótese em que o delito que lhe foi imputado nunca prescreverá. Em que pese Fernando da Costa Tourinho Filho ter defendido a tese de ‘não criação de imprescritibilidade’, por parte da alteração introduzida no artigo 366 do Código de Processo Penal, pela lei citada, a verdade é que, dentre as hipóteses que sugeriu, como solução, está aquela adotada pelos autores Damásio E. de Jesus e Luiz Flávio Gomes, no sentido de que a suspensão do prazo prescricional seja limitada, nos termos do artigo 109 do Código Penal, considerando a pena máxima em abstrato para o delito. Assim, em harmonia com uma das sugestões do autor Tourinho Filho e com os entendimentos dos autores Damásio de Jesus e Luiz Flávio Gomes, entendo que a melhor solução a ser adotada ao caso é a de se considerar como ‘limitado’ o período de incidência da suspensão do prazo prescricional, limitação esta que deverá ter por base a pena máxima prevista em abstrato para o delito e os prazos estabelecido no artigo 109 do Código Penal. Portanto, determinado pelo magistrado a suspensão do andamento do processo e do respectivo prazo prescricional, há que ser estabelecido, já na decisão citada, que essa “suspensão da prescrição” perdurará pelo limite supra citado.   VII- Retroatividade ou não da Lei nº 9.271/96, em face das alterações efetuadas no artigo 366 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, a lei supra criou, no artigo 366 do Código de Processo Penal, dois institutos novos, o da “suspensão do processo” e o da “suspensão do prazo prescricional”. O primeiro é de índole processual e o segundo de índole penal, daí as divergências, quanto ao momento de suas aplicações, isto porque, o instituto de direito processual penal tem aplicação imediata, nos termos do artigo 2º do Código de Processo Penal, o que significa dizer que, pode ser aplicado imediatamente aos processos em andamento, mesmo referente a fatos praticados anteriormente à  vigência da lei que o contém. Já o instituto de direito penal só pode ter aplicação imediata, aos processos em andamento, nas hipóteses em que não prejudicar o réu, nos termos do preceito constitucional previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, vale dizer, só pode alcançar fatos praticados antes da vigência da lei que o contém quando for para beneficiar o réu. Diante disso, criou-se pelo menos três correntes diferentes, referentes à aplicação do artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, a saber:    a-   Da irretroatividade total; b-   Da retroatividade total; c-   Da retroatividade parcial;   Quanto à primeira corrente, defendem-na, dentre outros, o Prof. Damásio E. de Jesus[11], nos seguintes termos: “A norma do art. 366, ‘caput’, do CPP, na parte em que determina a suspensão do processo, tem natureza processual penal, uma vez que disciplina o ‘desenvolvimento do processo’. Quando, entretanto, prevê a suspensão do prazo prescricional, é de direito penal material. Temos, então, uma disposição mista, impondo princípios de direito substantivo e processual. Quando isso ocorre, prevalece a natureza penal. E assim convém, uma vez que a suspensão do processo gera, fatalmente, o impedimento do decurso prescricional. O juiz, nos termos da nova legislação, sobrestando o processo, provoca automaticamente a suspensão do lapso prescricional, proibindo que o feito se dirija à extinção da punibilidade. Não se pode, pois, dissociar as duas formas de suspensão, a do processo e da prescrição, para se conferir à lei incidência imediata no que tange ao sobrestamento da ação penal (CPP, art. 2º) e efeito irretroativo na parte em que impõe a suspensão da prescrição (CP, art. 2º, parágrafo único). A suspensão do prazo prescricional em face do sobrestamento da ação penal era desconhecida em nossa legislação. Logo, o art. 366, nesse ponto, é mais gravoso que o ordenamento legal anterior (novatio legis in pejus). Deve ser, por isso, irretroativo, não se aplicando às infrações penais cometidas antes da vigência da lei (CF, art. 5º, XL; CP, art. 2º, parágrafo único). Com relação à segunda corrente, defendem-na, dentre outros, Luiz Flávio Gomes[12], a saber: “Admitindo-se algum ‘limite’ (quanto ao prazo da suspensão prescricional), já não se pode dizer que a nova lei tenha criado uma ‘situação de imprescritibilidade’ (eterna). … Assim enfocada a nova lei, não parece desarrazoada a tese da sua retroatividade total (parte processual e parte penal), mesmo porque caberia considerar o seguinte: em todas as hipóteses legais de suspensão do prazo prescricional ( … ) dá-se o advento de uma situação nova ‘posterior’ ao delito. A causa suspensiva do prazo prescricional ( … ) sempre surge depois do delito. A suspensão do prazo, nessas hipóteses, significa indiscutivelmente um certo prejuízo para o acusado, mas é uma imposição (proporcional) para se estabelecer um ‘equilíbrio de armas’. Se o Estado, pelas razões supra-indicadas, não pode exercitar temporariamente a persecução penal (não pode, em outras palavras, ‘fazer andar o processo’), tampouco parece justo que seja ‘punido’ com o transcurso do tempo. Assim considerada a questão, não tem relevância que a causa suspensiva tenha por base uma lei precedente ou venha inserida no contexto de uma lei nova. … No fundo, o que temos em conflito são dois direitos fundamentais do acusado: de um lado o direito de autodefesa, como expressão do devido processo legal, contraditório, ampla defesa etc.; de outro, o direito de não ser prejudicado por uma lei ‘penal’ nova. Urge a ponderação desses valores. … A teoria da proporcionalidade, que entra em cena sempre que vários direitos fundamentais estão em conflito, é extremamente útil para dar-nos uma luz ao complexo problema em questão. Concluindo, se ‘limitado’ o prazo de suspensão da prescrição (prazo certo, determinado), pode ser sustentável a tese da retroatividade total da lei (tanto na sua parte processual, como penal)”. No tocante à terceira corrente, defendem-na, dentre outros, Fernando da Costa Tourinho Filho[13], da seguinte forma: “O diploma legal em exame, ao determinar a ‘suspensão do processo’, deve ter tido incidência imediata, isto é, a partir de 17-6-1996, quando se expirou a ‘vacatio legis’, nos termos do artigo 2º do CPP, porquanto se trata de norma processual penal. … Mas, ao estabelecer a ‘suspensão do curso da prescrição’, a matéria é indiscutivelmente de natureza penal, subordinando-se às regras da temporalidade das normas penais. … E, considerando que o art. 5º, XL, da Lei Maior prescreve que ‘a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu’, parece claro que o diploma em análise, no seu aspecto penal, somente poderá ser aplicado às infrações que se verificaram a partir do dia 17 de junho de 1996, data em que começou a vigorar a Lei nº 9.271, de 17-4-1996”. Prossegue o mesmo autor[14] esclarecendo que: “Se se tratasse de um ‘instituto’ de aspecto duplo (penal e processual penal), tal como ocorre com a ‘representação’ e a ‘queixa’, que apresentam prevalentes caracteres penais, pela sua natural conexão com o direito penal material, aplicar-se-lhe-ia o princípio da irretroatividade. Na hipótese, não se trata de um instituto, mas de uma norma que cuida, num só contexto, de duas coisas distintas, apresentando, assim, uma natureza dúplice: penal e processual. Em face dessa duplicidade, não se pode, a nosso juízo, dar prevalência a uma ou a outra natureza. Assim, aos processos em curso, se houve citação-edital e o réu não constituiu Advogado, cumpre ao Juiz suspender apenas o curso do procedimento. … Insista-se: a suspensão do lapso prescricional somente será possível quando se tratar de infração cometida do dia 17 de junho de 1996 para a frente”. Dentre as correntes doutrinárias apresentadas, entendo que a mais convincente é que prevê a ‘irretroatividade total’ do artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, isto porque, julgo imbatível o argumento de que, trazendo a lei a ‘suspensão do prazo prescricional’, que não existia anteriormente no citado artigo, se trata de uma novatio legis in pejus, e como tal, não pode retroagir para atingir fatos praticados antes de sua vigência, sob pena de ferir o preceito constitucional do artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e a previsão legal do artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal. Quanto à corrente da ‘retroatividade total’ fica claro que a mesma esbarra nos preceitos constitucional e legal supra citados, que impedem a retroação da lei para prejudicar o réu, razão pela qual deve ser afastada. Com referência à corrente da ‘retroatividade parcial’, entendo também deva a mesma ser afastada, uma vez que não vejo justificativa legal para que se possa ‘cindir’ uma lei e aplicá-la apenas em parte, vale dizer, o magistrado iria aplicar parte de uma lei e, obviamente, parte de outra, o que implicaria, na prática, em criar uma nova lei, com partes extraídas das outras duas. Tal conduta, com certeza, fere o princípio constitucional da Independência dos Poderes, previsto no artigo 2º da Constituição Federal, uma vez que não compete ao Poder Judiciário elaborar (criar) leis. Portanto, o artigo 366 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, só deve ser aplicado a fatos praticados já na vigência desta.   VIII- Da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal. Com o advento da Lei nº 9.271/96 o artigo 368 do Código de Processo Penal passou a ter a seguinte redação: “Art. 368 – Estando o acusado no estrangeiro, em lugar sabido, será citado mediante carta rogatória, suspendendo-se o curso do prazo de prescrição até o seu cumprimento.” Pois bem, estabeleceu a lei acima citada que, se o réu estiver no estrangeiro, em lugar conhecido, será citado por rogatória, independentemente do delito ser afiançável ou não (antes da Lei nº 9.271/96 a citação por rogatória era apenas na hipótese de crime inafiançável), ficando suspenso o prazo prescricional até o cumprimento da carta.   IX- Requisitos para a Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal. Pela leitura no novo texto legal referido, podemos concluir que, para a suspensão do “prazo prescricional” são necessários os seguintes requisitos:   a-  Que o réu esteja no estrangeiro; b-  Que o réu, no estrangeiro, esteja em lugar conhecido;   O primeiro requisito é que o réu esteja no estrangeiro, vale dizer, fora do nosso país. O outro requisito é que, embora no estrangeiro, seja conhecido o local onde se encontra, ou seja, seja conhecido o seu endereço, pois a citação, ainda que por rogatória, não vai deixar de ser “pessoal”. Tais requisitos são extraídos da própria lei e são cumulativos, e não alternativos, vale dizer, deverão estar presentes concomitantemente para que o magistrado determine a expedição de carta rogatória para citação do acusado e, consequentemente, fique suspenso o prazo prescricional. Quanto aos requisitos citados, não há divergência na doutrina. Entretanto, existem aqui também inúmeras discussões doutrinárias quanto ao “prazo em que a prescrição pode ficar suspensa”, embora tenha sido previsto, de forma insatisfatória, ‘até o seu cumprimento (da carta rogatória)’, e quanto à “retroatividade ou não do artigo de lei referido”.   X- Período de Incidência da Suspensão do Prazo Prescricional prevista no artigo 368 do Código de Processo Penal – Conclusão. Pois bem, atendidos aos requisitos supra,  como já dito, deverá ser suspenso o prazo prescricional.  Contudo, o legislador falhou mais uma vez ao “não prever, de forma clara, qual o período em que a suspensão do prazo prescricional poderia incidir”, uma vez que, embora tenha estabelecido um termo para a suspensão da prescrição, “até o cumprimento da carta rogatória”, este foi muito vago, podendo significar, mais uma vez, atendendo a uma interpretação literal da lei, em tese, a hipótese de crime imprescritível, pois se a rogatória referida nunca retornar, nunca o respectivo crime prescreverá. Assim, reitera-se aqui tudo o que foi dito no “item VI”, quanto ao limite do período de incidência da suspensão do prazo prescricional, bem como que este limite deve estar previsto na decisão que determinar a citada suspensão.   XI- Retroatividade ou não da Lei nº 9.271/96, em face das alterações efetuadas no artigo 368 do Código de Processo Penal – Conclusão.   A lei supra criou, no artigo 368 do Código de Processo Penal, um instituto novo, referente à “suspensão do prazo prescricional”. Tal instituto é de direito penal substantivo e, como tal, só pode ter aplicação imediata, aos processos em andamento, na hipótese em que não prejudicar o réu, nos termos do preceito constitucional previsto no artigo 5º, inciso XL, da Constituição Federal, e do artigo 2º, parágrafo único, do Código Penal, vale dizer, só pode alcançar fatos praticados antes da vigência da lei que o contém quando for para beneficiar o réu. Contudo, a ‘suspensão do prazo prescricional’, prevista no artigo supra, é, sem dúvida, algo novo que veio em prejuízo do réu, portanto, se trata de uma novatio legis in pejus, e, assim sendo, não poderá retroagir para alcançar fatos praticados antes de sua vigência. Logo, o artigo 368 do Código de Processo Penal, alterado pela Lei nº 9.271/96, só deve ser aplicado a fatos praticados já na vigência desta.   XII- Jurisprudência – Conclusão.   No tocante à jurisprudência é oportuno citarmos a conclusão extraída do artigo escrito pelo eminente magistrado José Renato Nalini[15], que fez um apanhado sobre a tendência do TACrim/SP, referente às inovações da Lei nº 9.271/96, citando inúmeros julgados, a saber: “Até o momento, delineia-se, no maior e mais especializado Tribunal do Brasil, uma tendência a se considerá-la: a)‘constitucional’, ou seja, compatível com a ordem fundante; b) de ‘aplicação irretroativa’ para os crimes praticados antes de sua vigência, diante da natureza mista de norma a um tempo material e processual; c) ‘insuscetível de cisão’, ou seja, inviável a aplicação da parte considerada benéfica e a inaplicação da parte prejudicial ao réu; d) a ‘prisão preventiva não é conseqüência necessária do decreto de revelia’; e) a ‘produção antecipada de prova está confiada ao prudente arbítrio do Juiz em cada caso concreto’ e f) o recurso cabível da decisão que suspende o processo é o ‘recurso em sentido estrito’.  Outras questões ainda estão a suscitar dúvidas. O ‘prazo prescricional’ a ser observado, a partir de integral vigência da Lei, não encontra unanimidade na doutrina e jurisprudência. Dentre as opções possíveis, parece razoável a orientação que remete ao ‘caput’ do art. 109 do CP. O máximo da pena privativa de liberdade prevista para o crime é que passaria a ser considerado no cálculo desse lapso”. Portanto, dentro do tema do nosso trabalho, podemos observar que a jurisprudência tem se voltado no sentido das conclusões já explanadas em cada item acima, especificamente no sentido da “irretroatividade da lei” e, consequentemente, de sua não cisão, bem como de se estabelecer um “limite ao prazo da suspensão do processo”, que pode ser o previsto no artigo 109 do Código Penal, considerando a pena máxima prevista em abstrato para o delito.   XIII- Conclusão final. O legislador teve boa intenção, com a Lei nº 9.271/96, ao estatuir que o processo não poderia prosseguir sem a presença do acusado ou seu defensor constituído, suspendendo a prescrição, presumindo o desconhecimento daquele sobre os fatos que lhe estão sendo imputados, dando ênfase, dentre outros, aos princípios constitucionais da ‘ampla defesa’, ‘devido processo legal’ e ‘contraditório’. No dizer de René Ariel Dotti[16] “o grande desafio proposto pelo novo diploma consiste no empenho de resgatar a participação da imensa legião de pessoas que vive à margem do processo. Ela é composta pelos réus desaparecidos. Geralmente são os deserdados do testamento de Adão, nômades à procura de emprego, habitantes de moradias incertas, com fome e sem documento, e que não têm qualquer guia para lhes mostrar o édito onde seus nomes estão impressos ao lado de ignorados artigos de lei e da ameaça de condenação”. Sem embargo da culta manifestação do ilustre Prof. Dotti, temos que admitir também que, ao lado dos ‘deserdados do testamento de Adão’ estão os ‘criminosos profissionais’, aqueles que fazem do crime o seu meio de vida, não por falta de oportunidade para sobreviver honestamente, mas por vocação. Assim sendo, data venia, embora com boa intenção, quando o legislador previu a suspensão do processo indefinidamente e a possibilidade, e não obrigatoriedade, da produção antecipada da prova, mesmo que se considere, em contrapartida, a não fluência do prazo prescricional, criou uma possibilidade de fuga à responsabilidade penal, pois é evidente que após poucos anos, comparecendo o réu ou sendo preso, e voltando a fluir o processo e o respectivo prazo prescricional, na maioria das vezes não haverá mais prova alguma capaz de propiciar a sua condenação. Desta forma, seria fácil, em termos práticos, que algum ‘criminoso profissional’ seja ‘orientado’ por seu defensor a ‘desaparecer’ por alguns anos, e após checado o sumiço da prova testemunhal, poderia retornar para responder ao processo que estava suspenso, o qual, voltando a fluir, lhe trará, certamente, um resultado satisfatório, com absolvição por ausência ou insuficiência de prova para a condenação. Logo, temos que concluir que o legislador, ao prever a ‘suspensão do processo’, ressaltando direitos individuais constitucionais, embora em contrapartida tenha previsto também a ‘suspensão do prazo prescricional’, não conseguiu, com esta, evitar a criação de “um canal de impunidade”, como dito acima, prejudicando o Direito do Estado e porque não dizer da coletividade, de ver o autor de uma infração penal devidamente punido, nos termos legalmente previstos. [1] Prescrição da Ação Penal – Suas Causas Suspensivas e Interruptivas; Edit. Saraiva; 1.998; pg.99/100. [2] Roberto L. F. de Almeida Jr. e Wallace P. Martins Jr.; Art. ‘Reflexões sobre a Lei 9.271/96’; Rev. APMP; pg. 34. [3] Instituições de Direito Penal; Vol. I; Tomo II; Edit. Max Limond; 3ª Edição; pg. 695. [4] Obra já citada; pg. 707. [5] Direito Penal; 1º vol.- Parte Geral; Edit. Saraiva; 21ª Edição; pg. 711. [6] Obra já citada; pg. 733. [7] Código de Processo Penal Anotado; Edit. Saraiva; 13ª edição; pg. 242; Coment. ao art. 366 do CPP. [8] Artigo “Lei 9.271/76: O Direito à Prescritibilidade, a Questão da Retroatividade e as Primeiras Tendências Jurisprudenciais”; Jurisprudência Catarinense; vol. 77; pg.96. [9] Processo Penal; Vol. 3; Edit. Saraiva; 20ª Edição; pg. 197/201. [10] Obra já citada; pg. 199/200. [11] Obra já citada; pg.242/243; Coment. ao art. 366 do CPP. [12] Obra já citada; pg.100/101. [13] Obra já citada; pg. 194. [14] Obra já citada; pg. 195. [15] A Lei nº 9.271/96 e o Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo; RJTACrim, São Paulo; jan/mar 1998. [16] Art. ‘A Ausência do Acusado e a Suspensão do Processo’; RT 400/401-3.

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